Há neste exercício de escrita um esforço suplementar de quem, há quase 3 décadas faz das tábuas da redação e de salas de aula, o espaço onde exercita e procura aperfeiçoar, como lhe chamou Gabriel Garcia Marquez, “a mais bela profissão do mundo”. Não tenho este conceito enraizado, muito menos a pretensão de que ser jornalista é a cereja no topo do bolo das atividades profissionais. No entanto, há na procura da verdade, no exercício permanente do contraditório, e no compromisso de lealdade para com o público, pilares que se constituem como essenciais ao seu desempenho e que merecem a mais profunda das admirações.
Durante décadas tenho questionado milhares de alunos sobre o conceito de notícia e sobre as múltiplas formas de o abordar. Tenho repetido vezes sem conta de que, sendo um facto actual de interesse geral, notícia não busca o qualificativo de ser boa ou má, mas de ser fiel aos factos que relata. Imerso na crise que me confina aos metros quadrados que me rodeiam mas que não me isolam do mundo, questiono por estes dias esta dupla faceta do conceito: a boa notícia e a má notícia. Daqui se depreende que a neutralidade, perante quem a produz, quem nela é envolvida, a quem se dirige e os seus efeitos, são de tal forma distintos que a sua classificação irá mudar com o prisma da observação.
Boa notícia é a que nos traz otimismo, esperança, que nos renova a confiança e que nos faz renovar o sentimento de segurança? Boa notícia é a que nos traz um mundo formatado de um modo benéfico, favorável, orientado? Boa notícia é a que se compromete com verdade ou que apenas quer ver uma parte da realidade que nos rodeia? No lado oposto, a má notícia será a que, revestida da crueza e crueldade dos factos, nos devolve um mundo pontuado de imperfeições? Má notícia é aquela que não gostaríamos de receber pelo impacto negativo que nos provoca? Por ser má notícia, renunciamos intencionalmente, à parte menos boa que nos circunda? Esteja no fim da rua, ou no fim do mundo? Trago dúvidas para um espaço que procura estimular segurança, certezas, perspetivas e horizontes de esperança. Não, não se trata de uma provocação, muito menos de um discurso fora do contexto em que é difundido.
Por estes dias de repetições mil, feito de sombras e lugares escuros, é preciso contrariar, encontrar defesas, vacinas, resistências, imunidades para que o espírito não se renda à realidade óbvia. Pela primeira vez assumo colocar essa viseira, como se um filtro intencional me fizesse ver o lado bom da coisa menos boa. E dele aprender, que mesmo a mais dura das notícias, pode e deve ser encarada com o mais sólido alento. É dessa força invisível que devem ser feitos os nossos dias: doses reforçadas de sais minerais e vitaminas para estimular a nossa existência e perspetivar tantas primaveras!
PROVEDOR DO LEITOR
Ricardo Nunes
Professor
Contacto do Provedor: ricardo.melo.nunes@gmail.com