Aproveito este título, não para divulgar o meu último livro de poemas “A Voz das Palavras”, nascido e consumido durante a pandemia, sem sessão de apresentação, mas para exaltar a alegria de ver coroada de êxito a participação do alentejano de Beja, Luís Trigacheiro no “The Voice Portugal”. Isso mesmo, a Voz de Portugal, a mais linda, a mais sentida, em mais uma edição deste concurso de talentos musicais.
Num concurso desta natureza que faz uso e abuso do número de chamadas telefónicas para galardoar os melhores, revelo que, pela primeira vez, não resisti ao impulso de fazer esses telefonemas e confesso que, sensibilizado, chorei ao ouvir a canção de “As Mondadeiras”. Uma canção tão nossa, do nosso Alentejo, que nos entra alma adentro e bebe sequiosamente das nossas origens. Mas que é, ao mesmo tempo, uma canção de Portugal e que, pela voz do Luís Trigacheiro chega a todo o mundo revelando a solidão, o silêncio e o sofrimento de um povo que se soergue das agruras da vida, rasgando os caminhos da liberdade.
Uma voz clara e límpida, deu sentido profundo às palavras, cosendo-as numa harmonia deliciosa que faz bem ouvirem-se. Nessa identidade com o que escrevi na contracapa do meu livro: “para além de se reduzirem à função para que foram criadas, as palavras têm movimento, têm cheiro, têm voz que é preciso descobrir, porque a voz faz parte intrínseca da palavra, melhor, é a essência da palavra”, direi que, maravilhado me rendi sem reservas a uma voz única que perfumou as minhas memórias e, porque não (?), a saudade do meu Alentejo.
A voz do Luís, a voz de Portugal, mais realça a falta de palavras num tempo de mordaça para os afetos, desejando, a ele e a todos nós, que não percamos a magia da palavra.
A magia da palavra
Procuro a magia da palavra que acalma,
desfaz os sons cinzentos trepidantes.
E todo o silêncio me leva
baloiçando na folha que se desprende
e cai, levemente, na calçada.
Um pincel e tinta tivesse e a mão
mestra a suave cor certa não falhasse.
E a palavra em movimento toda floria,
alegre e viva, a dar vida ao que fenece.
Como pode a palavra ser amiga e companheira
feita à medida desta solidão?
Solidão que se rende a si própria e se nega,
que quer ser folha e aguarela
ou quem sabe tão só ser a palavra
que desfeita, desperta e se refaz nela.
(in “A Voz das Palavras”, fevereiro 2020)
José António Contradanças
Economista / Gestor