O ano mais ‘horribilis’ das nossas vidas

Nunca como em 2020 a ideia do ‘ano horribilis’ fez tanto sentido, com a avalanche da pandemia e um ‘novo normal’ a ditar os nossos passos, limitando as liberdades, impedindo os afetos e a deixar pesadas marcas, dramas e grandes amarguras em milhares de famílias a braços com uma doença de causas invisíveis e efeitos desconhecidos.

Foi este, de facto, o nosso verdadeiro ‘Ano Horribilis’, que deitou por terra alguns sonhos e muitos projetos, que moldou formas de estar, de sentir e de pensar. Que trouxe ao de cimo verdadeiros heróis, uma avassaladora onda de solidariedade, e a capacidade tremenda de um país pequeno para a adaptação e para a resiliência.

Ainda não digerimos toda a complexidade com que a pandemia nos tem confrontado enquanto seres individuais, família e sociedade. Muito menos os efeitos perniciosos que podem surgir no valor sagrado do contrato social que nos liga à escala ocidental. Mas sabemos que muito está a mudar em múltiplos aspetos da nossa vida quotidiana.

Como nos iremos ligar no futuro próximo? Que valores mais altos se levantarão perante um meio sanitário comum que foi abalroado? E como vai ser a nova globalização? E muitas outras dúvidas para as quais as respostas de agora pecarão sempre por serem extemporâneas.

Dizer que foi um ano atípico é muito pouco, mas ainda não se fizeram todas as contas: Como ficaram as nossas cabeças e o nosso entendimento do mundo; que receios e medos perdurarão a seguir; e sentimentos como a desconfiança, a individualidade, e talvez o salve-se quem puder não se sobreporão ao novo amor e afeto, à sensatez e à coerência, ao trabalho de equipa e à coletividade. Muitas incógnitas no lastro de um ano que correu de forma tão vertiginosa, mas que parece ainda não ter acabado.

Raul Tavares
Diretor