O vírus antecipou a ‘silly season’

Parece que o vírus não só está a servir de pretexto para os que querem adiar as eleições autárquicas, mas também para antecipar a ‘silly season’, aquele período de veraneio em que os políticos, de férias, aproveitam para jogar aos fait-divers.

Desde logo por essa corrida às autarquias do país. PS e PSD aprovaram recentemente uma lei que, assim ao de leve, cria dificuldades às candidaturas independentes, conquista que o país se vangloria há alguns anos. Isto é, o PS aprovou, mas prepara-se para a alterar de novo, porque há vozes no partido, nomeadamente a presidente do seu grupo parlamentar, Ana Catarina Mendes, que considera a mesma “penalizadora da vida democrática”.

A posição do PSD é ainda algo híbrida, mas o líder social-democrata já anda a clamar aos quatro ventos que as andanças do vírus justificam, sem contestação, atrasar as eleições agendadas para outubro por mais uns meses. Até porque, a seu favor, o ‘cientista’ Rui Rio tem acertado sempre ao lado no confina, desconfina, e a sua eloquência tem muito daquele comentador desportivo que inventou a famigerada frase: “prognósticos só no fim do jogo”.

A subida de um militar ao comando da ‘task-force’ que está a implementar a vacinação tem também servido para alguma direita proclamar que os comandos das nossas forças armadas são mais capazes de ‘fazer’ que todos os outros setores do país, incluindo, forçosamente, os políticos. Delícia ouvir o eterno candidato centrista Lobo Xavier a aplaudir a chegada das armas para gerir a saúde, mas também a educação, a justiça, a cultura e não sei mais o quê.

Depois, a guerrilha de verbo surgida esta semana entre bloquistas e populistas a propósito da morte, por covid, diga-se, de um tal Marcelino da Mata, o militar mais galardoado de Portugal que, ao que parece, em defesa e em ordem do país matou que se fartou na guerra colonial. Sobretudo porque não é branco. Por estas e por outras é que os radicais americanos ‘Alt-Right’, conhecidos por serem as tropas de Trump, já avisaram que a próxima chacina será racial, a supremacia branca contra o resto do colorido humano. E já avisaram que não vai ser bonito.

O pior é que por este andar a ‘silly season’ antecipada ainda vai durar até ao verão. E, depois, se o maldito vírus permitir, vai tudo a banhos reforçados, até à rentrée política, porque ‘show must go on’.

Raul Tavares
Diretor