Vai longe o tempo em que o setor marítimo dava cartas na região, pela riqueza económica e social trazida pela dinâmica dos portos e das docas de pesca de Sesimbra, Setúbal e Sines. Essa dimensão de parte do setor primário da economia regional esfumou-se nos tempos do “cavaquismo” e das políticas europeias para o setor.
No caso da pesca costeira, hoje já quase que não se regateiam quotas para a sardinha, porque não há quem as apanhe nas quantidades permitidas. Faltam homens do mar, homens da pesca, porque a atividade perdeu valor e, sobretudo, não se renovou em geração.
Não sei se a pesca é um parente pobre das nossas políticas de desenvolvimento, até porque tem havido algum investimento tanto em equipamentos, infraestruturas e condições de mar, para barcos e para pescadores, mas cheira a pouco. Muito pouco, porque subsiste um sentimento que tudo vai bem, porque o peixe chega à mesa, mas na realidade o setor vai definhando.
Ao longo das várias eleições autárquicas em concelhos com tanta tradição no mar e nas pescas, como acima refiro – Sesimbra, Setúbal, Sines e, mais recentemente, Caparica, Trafaria e Fonte da Telha, que ganharam algum peso – é rara a alusão a este importante cluster da economia local. E isso, a meu ver, é um sinal.
Vale que, por exemplo, a Docapesca de Sesimbra, seja a primeira do país em transação de pescado e a segundo em rendimento, mas uma grande parte dos pescadores locais, profundos e experientes conhecedores do “métier” zarparam para as mesas dos cafés e dos restaurantes, numa reconversão exigida pela fragilidade do setor.
E apesar dos progressos na formação que o país tem experimentado, oferendo aos jovens maior capacitação para a atividade, uma profissão honrada e um percurso profissional irrepreensível, as tripulações continuam com lugares vagos, recorrendo, quase sempre, a braços estrangeiros.
Pode dizer-se que é o que é… E que são sinais dos novos tempos. Mas talvez valesse a pena olhar para o fenómeno, porque a pesca é daqueles setores vitais que não pode continuar a sofrer uma tão grande erosão de recursos humanos.
Quando a sardinha deixar de chegar à mesa com tanta abundância, e a que chegar a preços principescos, talvez se comece a olhar para o fenómeno com outra atenção. E, sobretudo, ouvir as associações de armadores e os pescadores na procura de soluções que possam mitigar tão grave pronúncio.
Raul Tavares
Diretor