São Bernardo em pré-calamidade, SIM aconselha deslocação para outros hospitais

Há médicos que em sete meses já fizeram 700 horas extraordinárias, cinco vezes mais do que é permitido legalmente. Urgências são asseguradas por clínicos com mais de 55 anos.

A situação do Hospital de São Bernardo, em Setúbal, é de pré-calamidade, com os serviços de urgência a serem assegurados por menos de metade dos clínicos que deveriam estar destacados. De acordo com o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), a situação só não é de “absoluta calamidade” porque são os profissionais com mais de 55 anos quem, apesar de não terem essa obrigação, conseguem fazer os turnos da noite.

“O apelo que fazemos é para que o Estado não feche os olhos à situação, à realidade. É preciso olhar para o que está a acontecer no hospital de Setúbal com olhos de ver. É por isso que estamos a apelar ao INEM para que, por exemplo, em dias de maiores carências, não transporte os doentes para esse hospital onde existem médicos que fazem 80 horas de trabalho por semana e outros que, apesar de ser desaconselhável, por estar em causa o atendimento dos doentes e a própria defesa dos clínicos, fazem dois serviços de urgência por semana”, disse ao Semmais o porta-voz do SIM, Jorge Roque da Cunha.

Para o mesmo responsável sindical a gravidade do que se passa atualmente no São Bernardo pode medir-se, por exemplo, com o número de médicos do serviço de obstetrícia: “Deveriam ser 23, mas só existem 12. Desses, dois estão ausentes e oito têm mais de 55 anos, o que faz com que de imediato possam pedir escusa do trabalho noturno. Não são obrigados a fazer urgência”. Jorge Roque da Cunha explica também que o problema é transversal às diversas especialidades clínicas e endereça às entidades públicas em causa, sobretudo a administração hospital, a administração regional de saúde e o ministério, as culpas pela atual situação. “A maior parte dos médicos fizeram, nos últimos sete meses, mais de 400 horas extra, quando o limite são 150. Os médicos estão, naturalmente, exaustos”.

 

Administração do CHS diz que “urgência funciona normalmente”

Face às acusações do SIM e dos seus associados, a administração do Centro Hospitalar de Setúbal (CHS) reconheceu, através de um comunicado, a dificuldade na contração de médicos. No entanto, no mesmo documento, negou que existam problemas com a gravidade atribuída no serviço de urgência.

“O Serviço de Urgência Geral está a funcionar normalmente e de forma articulada com os hospitais da península de Setúbal, apesar das dificuldades que temos tido na contratação de profissionais para constituição de escalas e não comprometendo o gozo de férias por parte dos nossos colaboradores que se acumularam em virtude da total dedicação ao surto pandémico”, refere a nota em causa.

A administração refere, por outro lado, que o número de médicos que ali trabalham tem vindo a aumentar nos últimos três anos. Assim, em 2018, estariam ali a trabalhar 393 clínicos no quadro mais 82 em regime de prestação individual. Esse número terá subido, respetivamente, para 400 e 100 profissionais em 2019. Não foram divulgados números relativos ao ano passado.

Estes números colidem, com a visão do SIM que, reportando-se à situação dos médicos a nível nacional, aponta três causas fundamentais para a crescente falta de médicos e o previsível agravamento da situação: 1.600 que se vão reformar nos próximos três anos; 50 por cento das vagas que anualmente, desde 2018, ficam por preencher em todo o país; perda de 23 por cento dos salários face ao que é pago pelos privados.