Há uma grande polémica nestas autárquicas que não lembra a ninguém e só se justifica pela mentalidade ainda a raiar o tacanho da nossa classe política.
Parece estar a ‘cair-o-carmo-e-trindade’ porque o líder do PS, que é também primeiro ministro, tem usado a ‘bazuca’ do Plano de Reestruturação e Resiliência (PRR) nos seus discursos de campanha, utilizando, dessa forma – dizem os críticos – uma arma do Governo para fins eleitoralistas.
É este o pano de fundo e o contexto da desdita que está a dominar as atenções. Portanto, para muitos, seria mais adequado fazer hibernar o PRR, mesmo que daqui a uns meses este vá ser o grande instrumento dinamizador de algumas das principais linhas de força das políticas autárquicas do próximo ciclo.
Se António Costa não deve deixar de colocar em cima da mesa o que está em causa com o PRR, muito menos os candidatos mais à séria de todas as forças políticas o devem fazer. Por uma razão muito simples: os futuros presidentes de câmara que não aproveitarem estes fundos e até, digo eu, os sorverem, estão condenados a um mandato cinzento e a uma oportunidade perdida. É esta a realidade.
Costa usa e abusa desta narrativa? Enquanto líder do seu partido acredito que sim. E mistura as suas duas condições: as de primeiro-ministro e secretário-geral do PS? Não deixa de ser verdade. Mas mesmo que o faça, não vejo onde está o problema. Antes pelo contrário, o tema veio a debate e isso serviu para acicatar uma campanha amorfa e as discussões estéreis entre candidatos com hipóteses de virem a gerir municípios e uma catadupa de amadores, impreparados e outras apreciações que não vêm ao caso neste texto.
Julgo mesmo que a pretexto destas investidas de António Costa, que quanto a mim, não dão voto algum – simplesmente porque parte substantiva do eleitorado não sabe, infelizmente, o que é e para o que vai servir o PRR – os candidatos de outros partidos que não os socialistas deveriam ripostar com os seus planos, ideias e estratégicas exatamente para mostrar como se estão a preparar, caso sejam eleitos, para aproveitar e gerir esses fundos que o PRR vai disponibilizar. Mas não! Importa mais a gincana política e os ‘sound-bites’ nos media e nas redes sociais.
Outra coisa, já agora, é o provincianismo de muitos candidatos do PS que se colaram à ‘esperteza’ de António Costa para afirmarem aos quatro ventos que são os “eleitos do PRR e do Governo” e que os seus telefones dispõem de uma linha aberta, ou mesmo escancarada com o primeiro ministro, ministros e secretários de Estado. Mas isso vale o que vale. E mais uma vez, passe o exagero, não valerá um voto que seja.
O eleitorado ‘cheira’ o candidato, ganha empatia, respeita ou não respeita a obra feita, atribui-lhe credibilidade, e quer saber, em última instância as ideias e as estratégicas para o seu concelho. Mais: quer ver implicações desses projetos na sua vida quotidiana. É isso que importa e é isso que está em jogo. O PRR, neste caso, deve ser debatido até ao tutano, porque é mesmo importante para o que está em jogo, a par de uma larga descentralização de competências que só autarcas preparados e visionários lhes podem deitar a mão.
Raul Tavares
Diretor