A publicação da Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital que visa aplicar em Portugal a estratégia europeia contra a desinformação, além de consagrar princípios fundamentais de direitos de acesso ao ambiente digital, de liberdade de expressão e criação de proteção da privacidade e de questões éticas correlacionadas com a inteligência artificial e a robótica, procura também encontrar soluções transparentes e democraticamente controladas de evitar a manipulação da informação, a distorção da verdade através de noticias falsas, a propagação do discurso de ódio e a falsificação deliberada da realidade através dos media digitais e das redes sociais.
A tarefa não é fácil. Distinguir a verdade da mentira na informação veiculada sempre foi complexo e subjetivo. No mundo multifacetado e aditivado tecnologicamente em que hoje vivemos isso ainda é mais difícil. Tal como distinguir o que é opinião, que deve ser inequivocamente livre no quadro constitucional vigente, da veiculação de factos falsos para corromper a democracia e gerar perceções que favoreçam abordagens populistas e totalitárias e capturem a liberdade de decisão e de escolha informada dos indivíduos.
Na legislação ainda em processo de finalização, a regulamentação da atribuição de competências e dos critérios para evitar a propagação da desinformação deliberada foi naturalmente a que suscitou mais debate na nossa sociedade. Desenganem-se os que pensam que o tema tem respostas fáceis e consensuais. Estamos perante desafios novos. Temos que nos socorrer da solidez dos valores e encontrar soluções criativas que nos ajudem a preservá-los. A inteligência artificial e os algoritmos, sob controlo humano e espero que ético e democrático, vão ser chamados a dar uma ajuda. Todo o debate e toda a polémica bem-intencionada são bem-vindos para ajudar a aclarar este tema determinante para o nosso futuro coletivo.
O essencial, no entanto, para vencer o combate contra a desinformação nos media e nas redes na era digital será a literacia dos indivíduos, em si próprios e inseridos nas comunidades e nas organizações, a sua capacidade de atribuir significados, interpretar as mensagens, selecionar os conteúdos e preservar a sua liberdade de pensamento e de decisão.
Num debate ocorrido há alguns meses versando a revisão da lei da imprensa, o Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media Nuno Artur Silva, defendeu a criação de uma disciplina específica e autónoma no sistema de ensino, versando a literacia mediática. É um passo que merece a minha concordância, mas teremos que ir ainda longe. Essa competência deve ser trabalhada ao longo de todo o ciclo formativo, seja na formação inicial, seja na formação ao longo da vida. É mais fácil propor do que concretizar, mas o tempo de agir é agora. Sem Mais.
Carlos Zorrinho
Eurodeputado PS