Numa das últimas sessões do executivo camarário de Sesimbra assisti, via online, a um triste e lamentável espetáculo, em que quase nenhuma das forças políticas e seus representantes fica livre de crítica.
Nas últimas autárquicas, os socialistas lograram retirar a maioria absoluta à CDU e, de forma construtiva, julgo eu, fizeram ou aceitaram um acordo de ciclo político com o presidente Francisco Jesus, que deu provas, neste caso, de grande sensibilidade democrática e, sobretudo, de humildade política, assumindo que colocou acima dos interesses partidários os interesses da gestão municipal.
Num município com sete vereadores, incluindo o presidente, CDU e PS teceram, assim, uma maioria gorda, que permite uma gestão serena sem abafar as diferenças e toldar os projetos estratégicos de cada uma das duas forças políticas, evitando bloqueios mais acintosos, jogos e gincanas partidárias que só atrasam e nada acrescentam.
Ficou de fora o vereador eleito pelo Chega que, não muito tempo depois, passou a independente. Alegadamente, por ser colaborante e muito interessado, o presidente do município ofereceu-lhe um pelouro e colocou-o dentro da solução governativa.
Este é o contexto e o enquadramento.
Na sessão a que aludo, o PS criticou o edil por ter chamado ao trabalho um ex-Chega, patrocinando o envolvimento de um “extremista de direita” e deixando preocupações futuras no zelo que este terá, ao abrigo das suas funções na Proteção Civil, ao lidar com famílias do RSI ou ciganas, entre outros mimos. O vereador respondeu à Chega, ofendendo em público os colegas socialistas e trazendo à coação convites e conversas feitas com o líder do PS local sobre como retirar poder e fazer “a vida negra” à CDU e ao presidente da câmara. Não houve grandes desmentidos, antes pelo contrário.
O resto da desdita foi lamentável e não merece reprodução.
Restam algumas dúvidas e notas finais:
Que credibilidade merece o vereador ex-Chega, quando, pelos vistos, tentou colar-se a cada um dos partidos, os do sistema, que andou a zurzir na campanha eleitoral? E que confiança pessoal e política merece quando faz alarde de conversas privadas e procede a um vernáculo impróprio de uma instituição como a que representa e para a qual foi eleito?
Que legitimidade têm os socialistas de criticar a opção do presidente em atribuir pelouro ao referido vereador quando aceitaram conversas com o próprio, antes e depois da realização das eleições autárquicas, ao ponto de quase discutirem a sua integração nas listas do PS?
E a CDU precisava mesmo de resgatar o vereador que, mesmo com a desvinculação do partido chefiado por André Ventura, certamente não mudou a sua forma de pensar nem trucidou, assim, de repente, a sua ideologia extremista de direita?
Faz sentido ‘normalizar’ estas formas de atuação, em nome da democracia, como sentenciou a vice-presidente da câmara, eleita pela CDU?
Tenho dúvidas. A democracia fez eleger o vereador ex-Chega, e isso é legítimo. Mas mais que isso, é desvirtuar a sua essência. Não havia necessidade. Vindo de uma comunista é ainda mais confuso de perceber… Ou serão os novos tempos… Quem é que não passará?
Raul Tavares
Diretor