E para além da guerra…

Enquanto a guerra de Putin vai avançado, deixando um rasto de destruição e de vítimas, já com centenas de mortes contabilizadas e lastro incomensurável de refugiados, o mundo regista uma elevada ‘prontidão’ para o que vem a seguir.

A China, por exemplo, com uma posição aparentemente dúbia, emergirá desta inusitada e terrível contenda como o player intocável. Nas últimas décadas fortaleceu o seu poderia económico e vai sair ainda mais agigantado.

Num jogo de surdos, Xi Jiping apoia tacitamente Putin (será a saída deste na amenização dos bloqueios) mas não se intromete diretamente na guerra. Pode até ser, em última instância, uma das chaves no convencimento dos russos em aceitar um cessar-fogo ou uma das múltiplas soluções que levem ao fim do conflito.

O mundo ocidental está a preparar-se para uma metamorfose que vai deixar grandes marcas, sobretudo a Europa, e em particular a União Europeia, agora ‘obrigada’ a militarizar-se em grande escala, robustecendo os orçamentos para armamento e para fundos de guerra, a pretexto desta vizinhança bélica.

As consequências são enormes numa altura em que não só se estava a empreender a recuperação económica pós-Covid, como fazer renascer as lógicas de uma Europa social, vertida pelo Tratado de Lisboa, e ostracizada pelas guerras do mundo financeiro do início do século.

Com esta investida à margem do direito internacional, Putin logrou unir os seus inimigos de sempre, dando razão aos europeus e americanos para voltarem a creditar a Aliança Atlântica.

Mas o maior medo de Putin não é a expansão militar do ‘inimigo’ para junto das suas portas, mas sim a contaminação política e ideológica de uma Ucrânia com modos de vida ocidentalizados. E a ‘mistura’ que esta frente democrática, livre e liberal pode representar no caldo de culturas que une os povos da Ucrânia e da Rússia. E, nesta conceção, Putin prefere perder além-fronteiras do que ser derrotado entre os seus.

Raul Tavares
Diretor