Até 29 de Junho estão abertos os concursos para os Apoios Sustentados da Direcção-Geral das Artes relativos ao período 2023-2026. Neste momento são muitas as estruturas que, como a nossa, dedicam a maior parte do tempo a imaginar, orçamentar e justificar o que tencionam fazer nos próximos anos. É um período simultaneamente de idealismo e frustração, uma vez que implica colocarmos por escrito aquilo que são as nossas convicções e desejos, tendo em conta o que sabemos possível fazer com as condições que podemos garantir (para muitos de nós é ainda mais frustrante por sabemos que, com a nossa situação de afastamento em relação aos centros de poder, é pouco provável conseguirmos obter o financiamento a que nos estamos a candidatar). Embora esteja de acordo com a necessidade de escrutínio da forma como são atribuídos dinheiros públicos, cada vez mais me parece que a avaliação daquilo que é o valor de uma estrutura, ou grupo de artistas, só pode ser feita no terreno, sem pressa, tendo em atenção factores que, por melhor que seja a argumentação, dificilmente vão conseguir ser transmitidos através do preenchimento de um formulário.
Para tentarmos ultrapassar a sensação de que todo este trabalho pode ser em vão, agarramo-nos às convicções que nos fizeram fundar uma estrutura no Montijo, num momento em que regressamos, em certa medida, a uma sensação de enorme insegurança. Quando fundámos a Mascarenhas-Martins, em 2015, parecia um gesto insensato, tendo em conta que ainda não tínhamos conseguido livrar-nos das consequências da crise financeira que se iniciou em 2008. Agora, para além da pandemia que ainda não chegou ao fim, a guerra ensombra qualquer tipo de esperança no futuro que, na realidade, pode até já estar comprometido pela crise climática e ambiental.
Que convicções são estas que nos fazem continuar a lutar por esta causa com tão poucos militantes: a da cultura? Creio que uma das mais importantes é a crença que temos no que pode ocorrer de especial nas relações que se geram em torno da actividade artística e cultural. Nestes sete anos talvez não tenha sido possível estabelecermos tantas relações como gostaríamos, mas a verdade é que só podemos estar gratos por quem nos acompanha de uma maneira que nos faz sentir que vale a pena passar por todas as dificuldades inerentes ao tipo de actividade que desenvolvemos. É claro que também temos os nossos desejos de expressão, as nossas obsessões, as nossas teimosias estéticas, mas cada vez mais me parece que só interessa manter uma estrutura de produção artística e cultural num contexto como este, refiro-me ao concelho do Montijo, se estivermos disponíveis para entrar em diálogo com quem aqui vive através do que fazemos.
Esta temporada que se aproxima do fim foi a primeira em que conseguimos, finalmente, intensificar a programação, de forma a incluir não apenas aquilo que produzimos, mas também o trabalho de outros grupos e artistas. A sensação é a de que esse passo foi de enorme importância, mesmo que não corresponda ainda ao que achamos que podemos e queremos fazer. Não nos interessa contribuir para qualquer tipo de insularidade do nosso trabalho. Pelo contrário, o que queremos é trabalhar para que exista uma oferta cada vez mais regular e diversificada no território em que decidimos investir as nossas vidas.
É ao regressar a este tipo de pensamento que encontramos a motivação necessária. Este projecto já se tornou muito maior do que podíamos imaginar quando o começámos. Maior do que nós. Agora que voltamos a imaginar o seu futuro, só temos uma opção: apontar para o impossível.
À PARTE
Levi Martins
Diretor da Companhia Mascarenhas-Martins