A proposta do Governo para a criação de duas novas comunidades intermunicipais, uma da Grande Lisboa e outra da Península de Setúbal, pretende resolver “algumas assimetrias territoriais”, mas “não coloca em causa a manutenção da Área Metropolitana de Lisboa”
A iniciativa legislativa do Governo para alterar o modelo de organização administrativa do território ao nível das entidades intermunicipais insere-se no processo de revisão das NUT – Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos, para permitir maior acesso a fundos comunitários.
A proposta de lei foi aprovada na semana passada em Conselho de Ministros e entregue na segunda-feira na Assembleia da República, para apreciação na comissão parlamentar de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local, que deve promover a audição da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (Anafre).
Na quinta-feira, numa audição parlamentar no âmbito da discussão na especialidade do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023), a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, disse que a proposta do Governo é que as actuais comunidades intermunicipais do Oeste, Lezíria do Tejo e Médio Tejo (integradas na região de Lisboa e Vale do Tejo) sejam uma NUT II e a criação de uma NUT II e de uma sub-região NUT III na Península de Setúbal, que deixaria de estar inserida na Área Metropolitana de Lisboa (AML) no âmbito do acesso a fundos comunitários.
Neste processo, também a Grande Lisboa teria de se constituir como uma NUT II e uma NUT III, acrescentou Ana Abrunhosa.
“Tem-se verificado que a Península de Setúbal tem perdido competitividade por estar claramente distante do desenvolvimento da Grande Lisboa e onde se identificam situações de assimetrias metropolitanas, o que justifica tratar o território da Península de Setúbal como uma realidade específica, ainda que mantendo uma profunda relação funcional com a região de Lisboa e Vale do Tejo”, lê-se na proposta de lei.
Para responder a essas assimetrias territoriais na AML, o Governo propõe a criação das comunidades intermunicipais da Grande Lisboa e da Península de Setúbal, a partir dos concelhos a norte e a sul do Tejo da actual AML (que engloba 18 municípios, nove em cada margem do rio), respectivamente.
A CIM (Comunidade Intermunicipal) da Grande Lisboa será constituída por Amadora, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Odivelas, Oeiras, Sintra e Vila Franca de Xira, enquanto a CIM da Península de Setúbal irá integrar Alcochete, Almada, Barreiro, Moita, Montijo, Palmela, Seixal, Sesimbra e Setúbal.
“A definição destas duas comunidades intermunicipais não coloca em causa a manutenção da AML”, refere o Governo.
Em 2015, entrou em vigor uma nova divisão regional em Portugal, em que a AML passou a ser simultaneamente NUT II e NUT III, deixando a Península de Setúbal de ser unidade para fins estatísticos.
O Governo já tinha submetido a proposta de criação das novas NUT ao Eurostat – gabinete de estatísticas da União Europeia, com o objectivo de permitir a estas zonas terem maior acesso a fundos comunitários.
No entanto, o organismo europeu alertou que novas NUT tinham de corresponder a unidades político-administrativas existentes no território, pelo que a proposta de lei do Governo pretende alterar no Regime Jurídico das Autarquias Locais o mapa das entidades intermunicipais.
Na proposta de lei, o Governo sugere outras alterações no mapa nacional das NUT, nomeadamente que os concelhos da Sertã e da Vila de Rei passam da CIM do Médio Tejo para integrarem a CIM da Beira Baixa e que a CIM do Alto Tâmega passa a designar-se CIM do Alto Tâmega e Barroso.
A iniciativa legislativa não refere qual será o novo mapa das NUT com a criação das CIM da Grande Lisboa e da Península de Setúbal e com a alteração anunciada pela ministra da Coesão Territorial relativamente às CIM do Oeste, Lezíria do Tejo e Médio Tejo passarem a ser NUT II.
A Lusa questionou o Ministério da Coesão Territorial sobre o novo mapa das NUT, aguardando ainda uma resposta.
A ministra Ana Abrunhosa disse que as alterações pretendem que o Oeste e Ribatejo e a Península de Setúbal tenham programas operacionais regionais próprios e consigam co-financiamento europeu de projectos a uma taxa mais elevada do que a que é aplicada em Lisboa, uma zona que Bruxelas considera mais desenvolvida, e que, portanto, tem menos apoios europeus.
Caso a proposta de lei seja aprovada na Assembleia da República, o Governo enviará o novo diploma a Bruxelas, cabendo ao Eurostat a palavra final na decisão de aprovar ou não as alterações.
Se existir aprovação do Eurostat, as novas NUT “podem entrar em vigor em 2023”, mas, para efeitos de apoios de quadros comunitários, o sim de Bruxelas apenas terá efeitos a partir de 2027, pelo que o Governo está a procurar outras formas de compensar a Península de Setúbal.
No âmbito do sistema de divisão do território em regiões, a NUT – Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos subdivide-se em três níveis (NUT I, NUT II, NUT III), definidos de acordo com critérios populacionais, administrativos e geográficos.
Actualmente, os 308 municípios de Portugal agrupam-se em 25 NUT III, que correspondem a 21 comunidades intermunicipais no continente, às duas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e às duas regiões dos Açores e da Madeira, em sete NUT II, das quais cinco no continente (Norte, Centro, AML, Alentejo e Algarve) e ainda os territórios dos Açores e da Madeira, e três NUT I, correspondentes ao território do continente e de cada uma das regiões autónomas dos Açores e da Madeira.