Para além da caça às bruxas dos cargos, dos favores e de outros alegados negócios que bordejam a irregularidade e o crime, nas últimas semanas tem saído na rifa o desempenho do Plano de Recuperação e Resiliência.
Ora, o PRR é um pacote de muitos milhões com destino marcado em áreas que foram definidas por estratégia deste Governo e chancelado pela Comissão Europeia. O facto de parte substantiva, o grosso, aliás, ser a fundo perdido, gera uma gigantesca oportunidade. Significa, sobretudo, a meu ver, um aproveitamento rigoroso e mesmo verdadeiramente estratégico destas verbas.
Sabemos, desde a aprovação do pacote pelas instâncias europeias, que estes euros são mesmo para gastar e com prazos delimitados. O que implica uma gestão criteriosa, mas também um esforço de agregação entre as entidades promotoras dos projetos e o Estado e das ferramentas que gizou para avançar.
Mas não pode ser tudo à pressa. Muito menos vindo a pressão, só para dar um exemplo, do mais alto magistrado da nação, ainda por cima com intervenções públicas desbocadas, fazendo-se ladear pelo chefe da oposição nos disparos a uma ministra. Claro, logo a seguir, vieram mais uns tantos bater no ceguinho.
Em Portugal há um histórico pernicioso de falta de execução de fundos comunitários. Algumas dessas situações são mesmo graves, porque significam, muitas vezes, incompetência, falta de capacidade de gestão, preguiça técnica e muitas outras coisas que não vêm a caso. Mas o pior é a imagem que estas situações dão do país e da sua política de descentralização. Além de que são verbas importantes que, muitas vezes, têm que ser devolvidas à procedência. Tudo isto é verdade e muito embaraçoso para a comunidade lusa. Mas queremos um PRR à pressão?
Estes últimos ataques à maioria socialista, a pretexto do PRR, não ajudam e podem ter o efeito contrário. É para gastar, então que se gaste; que se cumpram todos os prazos, mesmo que isso devaste a estratégia, os objetivos e as metas.
Ocorre que neste mundo agitado, há circunstâncias novas que precisam de ser repensadas. A inflação, por exemplo, tem os seus efeitos no desenrolar dos projetos PRR. Conheço vários casos que estão a ser reequacionados por parte dos promotores, nomeadamente devido à parte que lhes toca de investimento direto. São complexidades. Também devido às mesmas circunstâncias, o Governo tem vindo a refazer algumas prioridades de destino de algumas destas verbas a fundo perdido.
Este nosso mundo está de cabeça para o ar, e a velocidade dos acontecimentos é mesmo uma vertigem. Não está fácil. Mas o pior que pode acontecer é mesmo esbanjar esta oportunidade lançando dinheiro só porque sim, não acautelando a trave-mestra que balizou este empreendimento tão relevante para o país, em concreto para as áreas sociais, da saúde, da habitação e dos investimentos empresariais.
Acredito que ao leme do PRR estejam pessoas que cumpram e que não se deixem enlamear nas politiquices ou protagonismos que, em vez de ajudar a construir, oferecem-se para deitar abaixo os seus alicerces.