Tolerar a Tolerância

No dia 18 de dezembro, comemora-se o Dia Internacional das Migrações. O Objetivo 10, da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável, elaborada pela Organização das Nações Unidas (ONU), tem como meta: Assegurar a segurança da migração e implementar políticas que a tornem ordenada e regular para reduzir as desigualdades.

Acerca desta matéria, tenho ouvido todo o tipo de análises e de opiniões, infelizmente, na sua grande maioria, alertando para o perigo da perca da nossa identidade nacional, defendendo o aumento de criminalidade no país e a usurpação dos nossos direitos e liberdades. Triste memória a nossa!

Já nos esquecemos das décadas de 50 e 60 do século passado onde, de forma legal ou ilegal, centenas de milhares, se não milhões, de portugueses, se espalharam pelos quatro cantos do mundo em busca de uma vida melhor, ou em fuga de uma guerra sem sentido? Mas não se pense que este processo terminou. Segundo dados do Alto Comissariado para as Migrações, Portugal é hoje o país da União Europeia com mais emigrantes em proporção da população residente. O número de emigrantes portugueses supera os dois milhões, o que significa que mais de 20% dos portugueses vive fora do país em que nasceu.

E que análise fazem as “mentes brilhantes” desta diáspora? “As razões eram outras”. “Demos novos mundos ao mundo”. “Enriquecemos os outros países com a nossa cultura e capacidade de trabalho”. Veja-se bem que até o Grão-Duque do Luxemburgo, agradeceu publicamente ao povo português, que neste momento representa quase 50% da sua população, tudo o que fez pelo seu país. Somos, pois, uns iluminados…

Que moral existe em recriminar as demandas com origem nas antigas colónias, ou do Brasil que para além da melhoria das condições de vida, buscam o conforto da língua, ou ainda da Moldávia, da Ucrânia, da Roménia e da China e, em contraponto, enaltecer a nossa epopeia migratória?

Relembre-se a nossa História. Se hoje somos um povo extraordinário (e eu acre- dito que sim), foi graças às influências dos migrantes Celtas, dos Fenícios e dos Cartagineses, dos Romanos, dos Suevos e dos Visigodos e dos Árabes e Berbéres, que vieram em busca deste pedaço de paraíso à beira-mar plantado. Eles são a nossa origem e a base da nossa cultura.

Quando ouvimos nas notícias, as incursões que migrantes, maioritariamente do Magrebe, fazem nas costas da Itália ou da Grécia e, mais recentemente, dos milhares de ucranianos que foram obrigados a sair do seu país, damos graças por estarmos na parte mais oriental Europa, comodamente sentados no nosso “sofá” da União Europeia. É de facto um privilégio, poucas vezes, devidamente valorizado.

Mas também, na nossa dormência burguesa e cada vez mais afastamento, do mundo global que nos rodeia e do qual fazemos parte, esquecemos os princípios e os valores pelos quais, queremos que os migrantes que acolhemos se rejam. Os valores da fraternidade, da igualdade, da liberdade e, principalmente da tolerância. E não é preciso grandes pactos, ou políticas globais de inserção. Basta fazê-lo, diariamente, no nosso trabalho, na nossa escola, na nossa rua, aceitando todos como nossos vizinhos, com as suas diferenças culturais e com as suas diferentes etnias e nacionalidades, com base no respeito mútuo.

Não sou muito a favor dos dias comemorativos, principalmente quando se referem a temas que devem ser cultivados todos os dias, mas, ainda assim, que dia 18 de dezembro, sirva para refletirmos sobre as palavras da ativista paquistanesa Malala Yousafzai, a mais jovem laureada com o Prémio Nobel e conhecida principalmente pela defesa dos direitos humanos das mulheres e do acesso à educação na sua região natal, agora emigrante no Reino Unido: “A diversidade promove a tolerância. Quando você não encontra pessoas diferentes, não percebe coisas, não percebe o quanto tem em comum com elas.”