No Laranjeiro há um quarto para alugar por 700 euros mensais, menos do que ganha um professor que faça um horário semanal de nove horas. Prevê-se que no final do ano muitas turmas não tenham os docentes previstos. Geografia, Informática, Matemática, Físico – Química e Português são as disciplinas mais carenciadas.
Quando o ano letivo que agora iniciou terminar, já na segunda quinzena de junho, o mais certo é que muitas turmas dos diversos agrupamentos escolares dos concelhos urbanos do distrito de Setúbal fechem as atividades sem terem podido contar com a totalidade dos professores. Esta é uma previsão do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa que, no passado dia 8, calculava que existissem no distrito cerca de 50 mil alunos sem docentes atribuídos.
“Neste ano letivo as dificuldades com que nos estamos a deparar são praticamente as mesmas dos anos anteriores. Só não dizemos que são as mesmas porque, se calhar, este ano até são um pouco piores”, disse ao Semmais o sindicalista João Pereira. “É verdade que este ano o Ministério da Educação está mais recetivo, uma vez que até agenda reuniões com os sindicatos, mas depois, durante essas mesmas reuniões, não avança com qualquer medida que possa ajudar a resolver os problemas relatados”, afirmou.
No concelhos urbanos do distrito de Setúbal, tal como acontece na generalidade do país, a maior carência de docentes faz-se notar nas disciplinas de Informática, Matemática, Física – Química, Geografia e Português. “Estas são as disciplinas com mais falta de professores e admitimos mesmo que em algumas delas, como é o caso da Informática, o ano letivo chegue ao termo sem que todas as turmas venham a ter professores colocados”, adiantou o mesmo responsável sindical.
João Pereira refere que o distrito de Setúbal, juntamente com o de Lisboa, é o mais afetado com a falta de professores. “É uma situação cíclica e que tem a ver, sobretudo, com a falta de incentivos para os professores. Estar a fazer um horário semanal de oito ou nove horas significa que, no final do mês, o professor vai receber menos do que o ordenado mínimo nacional. Com este tipo de pagamento, é normal que ninguém queira lecionar. Assim se explica, também, que nos últimos anos, muita gente esteja a abandonar a profissão para se dedicar a outras coisas”, referiu.
“O sindicato esteve representado (na segunda-feira) na Escola António Gedeão e o diretor do agrupamento transmitiu-nos algo que dá muito que pensar: próximo do Laranjeiro (concelho de Almada) descobriu um quarto para alugar por 700 euros. Com valores como este é evidente que nenhum professor vai preencher os horários. Na semana passada tinha sabido de um outro quarto por 500 euros, junto ao Cristo Rei, e pensei que era impossível, afinal… É pagar para trabalhar”, adiantou o responsável sindical.
O Sindicato dos Professores da Grande Lisboa entende que os atuais cerca de 1500 euros brutos pagos a um professor contratado que faça o horário completo e que integre o primeiro escalão não diferem muito dos 1800 euros brutos que se pagam a um docente do quadro que esteja colocado no terceiro escalão remuneratório. “O que é preciso é que o Ministério considere a Educação como um investimento e não como uma despesa. É preciso dignificar a profissão de professor e tranquilizar quem quer seguir a via do ensino. Se assim não for, dentro de meia dúzia de anos a situação será quase insuportável”, disse João Pereira.
“Nos últimos 10 ou 15 anos foram cerca de 15 mil os professores que abandonaram a atividade. Esta é uma classe que se encontra muito envelhecida e que, dentro de seis ou sete anos, poderá atingir um ponto ainda mais dramático do que o atual. Estimamos que nessa altura saiam cerca de 40 mil professores. As entradas são quase nulas e os contratados são cerca de 25 mil. Este tipo de problema resolver-se-ía bem se o Ministério aceitasse, por exemplo, integrar todos os professores que atualmente cumprem os horários completos. Deixava de haver a terrível incerteza de começar o ano letivo sem saber onde se vai parar e em que condições”, adiantou.
João Pereira diz, por outro lado, que muitos dos professores que são chamados para preencherem horários estão neste momento a procurar outras atividades laborais. “Os que conseguem não têm problemas em aceitar qualquer outro tipo de trabalho, porque serve de complemento para o que recebem a dar aulas”, explicou.
Greves anunciadas para todo o país
O ano letivo, que arranca em todo o país até ao final desta semana, promete ser marcado por diversas manifestações de professores. O congelamento do tempo de serviço, mas também as fracas remunerações para quem se vê obrigado a preencher horários escolares, são os principais motivos de descontentamento invocados pela Fenprof. Haverá greves ao sobretrabalho e às horas extraordinárias assim como à componente não letiva dos estabelecimentos.