País desgovernado e à deriva

A bomba mais recente do Ministério Público em Portugal, que levou à demissão do primeiro ministro, António Costa, deita por terra mais um mito da nossa política caseira, que elevava o manto do PS e dos socialistas a um domínio sórdido da Justiça no país.

As trapalhadas do caso Casa Pia, o mega processo de José Sócrates e, agora, este parágrafo vago e assassino do gabinete de Imprensa da Procuradoria Geral da República, refletem, isso sim, que ninguém do partido da rosa está acima da Justiça.

Esta circunstância não é um facto de somenos, nomeadamente este último episódio, que derrubou um primeiro ministro e um partido a coberto de uma maioria absoluta clara, num momento particularmente importante para o país e para os portugueses. Se tudo isto, no que toca a António Costa, não tiver substância alguma, numa vitória de Pirro a que pretexto for, é grave, muito grave, abrindo um precedente pernicioso.

A declaração de António Costa foi digna. Perante as suspeitas, mesmo sem nenhuma espécie de factualidade, só a demissão faria sentido. E outro tanto, a queda do Governo, como tantos há muito desejavam. Cabe agora ao Presidente da República descortinar a melhor forma de repor alguma normalidade no país.

Já se sabem os custos. Orçamento comprometido, execução e verbas do PRR em perigo, para além dos processos que estavam em andamento, nomeadamente a venda da TAP e as decisões que tardam sobre a localização do novo aeroporto.

O resto, que é o essencial, repor a normalidade política através do voto, resolve-se com um novo processo eleitoral, oferecendo aos portugueses a oportunidade de se pronunciarem e decidirem sobre a composição do Parlamento e nomeação de um novo Governo. O pior é que tudo isto se vai arrastar, no tempo e na lama.

A jusante destes factos estão os processos crime já conhecidos, com arguidos identificados e detidos aguardando as medidas de coação judicial. Aqui Costa tem culpas, e são da sua inteira responsabilidade, a começar por ter tido a teimosia de manter um ministro cravado de suspeitas e de balas. Um moribundo político que tem obrigado o primeiro ministro demissionário a uma sucessão de tiros nos pés. Acresce que as suas companhias próximas, ligadas a este processo do lítio e do hidrogénio verde, também nunca foram abonatórias.

Perante o baixo nível dos políticos em Portugal, António Costa era, ainda assim, uma das últimas reservas de competência e honestidade da classe, tendo provado, de crise em crise, estar a altura das dificuldades. Foi a sua teimosia, a par de alguma negligência, que o conduziu a esta situação.

Resta, no caso, que a Justiça, na sua legítima ação penal, pródiga a investigar, acusar e deter, perante suspeições, mesmo que vagas, faça o que é de direito. Concluir rapidamente os processos conhecidos e esclarecer os portugueses do andamento das investigações, que pelos vistos já dura há anos, e dos seus fundamentos. Porque o pior que pode acontecer é marinar suspeitas no caldo político que foi gerado e cozinhar em lume brando altas figuras do Estado.

Neste momento, António Costa não é arguido, logo não tem acesso ao processo, pelo que as autoridades judiciais têm a obrigação e o dever de informar se há ou não indícios sérios de algum envolvimento do primeiro ministro demissionário em que circunstâncias for