E ei-nos chegados aos 50 anos da Revolução de Abril , efeméride que deu lugar, em 1976, à aprovação de uma nova Constituição, que consagrou uma democracia política liberal, logo pluripartidária, que é garante da separação dos poderes legislativo, executivo e judicial e das liberdades fundamentais.
A deposição da ditadura que vigorou até 1974, assente na Constituição de 1933, foi opositora dos fundamentos das democracias liberais que têm ínsita a defesa das liberdades individuais e de associação.
O que escrevo nesses dois parágrafos são fundamentação plena para comemorarmos, com orgulho, também com gratidão e respeito a todos quantos, com determinação e coragem, nos ofereceram a Liberdade. Não é, por isso, aceitável que, por desinteresse ou ignorância do que é o 25 de Abril, não se louve e honre tamanha conquista, particularmente num tempo em que os convergentes com o 24 de abril dão sinais claros de ressurgimento.
Julgo importante recordar, massivamente, em permanência, o ‘antes’, particularmente a quem não vivenciou os factos. Recordar os passos de gigante que o país beneficiou de então para cá e o papel que teve o Partido Socialista na implementação do SNS, da escola pública, no contributo da integração na UE , como meros exemplos da luta pela defesa e aprofundamento dos princípios e valores da Revolução que nos cumpre defender.
Do regime da ditadura resultava a negação da igualdade de género com base em preceitos constitucionais, as alegadas ” diferenças ” entre os géneros conduzia a que as mulheres fossem grosseiramente limitadas na sua afirmação.
Acresce que a própria Constituição de 1933 considerava que as colónias eram províncias ultramarinas fazendo parte do Portugal ” pluricontinental “, negando a possibilidade da descolonização. A indisponibilidade do regime ditatorial de Portugal para a autodeterminação das colónias foi o gatilho para que os representantes dos partidos e movimentos de libertação entendessem não terem outra alternativa que não fosse a de apelarem aos respetivos povos para pegarem em armas , tendo-se desencadeado guerras coloniais em Angola, em 1961, seguidas na Guiné Bissau e Moçambique.
Os milicianos em contacto com os capitães do quadro permanente foram reforçando a recíproca consciência que a guerra colonial estava votada ao insucesso , sendo impossível uma vitória militar e que elas eram injustas e condenáveis.Esta consciência era crescentemente maior à medida que os anos passavam.
A publicação do livro ‘Portugal e o futuro’, do general António de Spinola, reconhecendo expressamente que as guerras coloniais não tinham solução militar, e que por isso foi demitido por Marcelo Caetano, ocorreu numa altura em que já estava em marcha um movimento de capitães do quadro permanente que reivindicavam correções salariais e que evoluiu rapidamente para um movimento organizado para a queda da ditadura
Daí que o Manifesto do Movimento das Forças Armadas (MFA) que na madrugada de 25 de Abril de 1974 desencadeou a revolução comece por referir que “o sistema político vigente não conseguiu definir , concreta e objetivamente, uma política ultramarina que conduza à paz entre os portugueses de todas as raças e credos” justificando ser derrubado.
Premonitoriamente Mário Soares funda o Partido Socialista no exilio prosseguindo a luta em prol da liberdade de Portugal e dos seus concidadãos depois de ter sido deportado para S. Tomé, então colónia portuguesa , facto precedido por dez prisões por razões políticas na ditadura.
Chegado a Lisboa no ‘comboio da liberdade’ embrenha-se em consolidar e mobilizar os seus concidadãos para o Partido que criara a fim de seguir o caminho da democracia
Foi um caminho difícil tanto mais que a então divisão do mundo ocidental democrático e o da ex URSS fizeram transpor para o início da jovem democracia a tensão entre ideários partidários contrários.
O PREC, processo revolucionário em curso, fez refletir essa tensão conflitual , com o PS intransigentemente defensor da democracia liberal e com ela a realização de eleições para a Constituinte , objetivo alcançado com a aprovação em abril de 1976.
Ainda em junho 1975, com Mário Soares à cabeça, foi mobilizada uma gigantesca manifestação, a da Alameda , em defesa da democracia e das liberdades contra os totalitarismos.
Mais tarde, em 25 de novembro desse mesmo ano o PS esteve de novo em defesa da liberdade.
Como Presidente da Federação do PS do distrito de Setúbal, ao sublinhar factos históricos, relevo o papel que o PS sempre teve na defesa da liberdade e da democracia honrando a memória dos fundadores do Partido e em particular Mário Soares que este ano faria 100 anos.
Aliás, ao evocar o cinquentenário da Revolução de 25 de Abril tenho presente as mulheres e os homens que lutaram contra a ditadura e todos quantos no MFA foram determinantes para a sua queda.
Hoje, vivemos tempos que nos exortam para desafios emergentes , muitos ‘novidades’, decorrentes da impressionante evolução da tecnologia e da ciência , do crescimento demográfico exponencial e das assimetrias demográficas, de processos migratórios de massas, de alterações climáticas , do agravamento das desigualdades, mas também do expectoro da guerra , que concorrem para uma acentuada incerteza no futuro, dando espaço de intervenção a correntes populistas que se afadigam trabalhando para a erosão da democracia.
Uma coisa é certa, quem derrubou uma ditadura de quase meio século sem dar um tiro e consolidou a democracia, goza de maturidade e experiência para enfrentar novas intentonas.
No cinquentenário do 25 de Abril é a luta comum por um futuro de esperança que continua a animar o PS, exemplo da luta pela democracia e por um mundo melhor.