Outrora era uma atividade que movimentava muitos milhões. Agora, com a falta de água, o tratamento de pinhas e pinhões ameaça passar à história. As fábricas estão a fechar ao ritmo a que os furos de captação crescem sem aparente controlo.
A falta de água no denominado aquífero do Sado, uma das principais reservas subterrâneas que abastece os concelhos de Grândola e Alcácer do Sal, é responsável, nos últimos nove anos, por um decréscimo de, pelo menos, 70 por cento da produção de pinhas e pinhões. A denúncia é da Associação de Agricultores de Grândola, cujos responsáveis referem que os problemas existentes não se devem apenas às alterações climáticas e redução da pluviosidade, mas sobretudo à falta de fiscalização dos furos.
“Nos últimos oito ou nove anos a redução da produção de pinha e pinhão é de, pelo menos, 70 por cento. Se quisermos ter uma dimensão da crise neste setor, temos de ver quantas fábricas ligadas a esta atividade têm fechado. A última foi a de um grupo espanhol, que estava em Pegões. Assim que viram o caminho que este negócio está a levar, venderam e foram embora”, disse ao Semmais o presidente da Associação de Agricultores de Grândola, António Rocha.
O mesmo responsável associativo diz igualmente que a crise que está instalada no setor florestal da região, sobretudo no que se refere aos pinhais, tem feito com que muitos produtores estejam a mandar abater largas extensões de pinheiros mansos e bravos. “Os prejuízos são de milhões, muitos milhões. As extrações de água efetuadas nos últimos anos são, talvez, a principal causa deste problema que tantos danos está a causar à agricultura e silvicultura da região”, afirmou.
“Os concelhos de Grândola e Alcácer do Sal têm registado consumos brutais de água. Há cada vez mais hotéis e campos de golfe, que não paramde dizimar os aquíferos. Para agravar ainda mais a situação, entendemos que quem deveria controlar estes consumos não o faz”, diz o presidente da Associação de Agricultores de Grândola, acusando diretamente as entidades estatais que têm a incumbência de controlar a exploração dos furos existentes.
António Rocha afi rma que “ninguém sabe quantos furos existem e quais os respetivos consumos”: “O que temos a certeza é que muitos, talvez mais de metade, são ilegais. Sabemos também que quem tem de vigiar este setor nem sequer procura saber se são ou não efetuadas as obrigatórias limpezas de verão. Os consumos são tão excessivos que é impossível haver recargas na dimensão desejada e adequada. O que se passa é que cada qual gasta a água que entende e que não existe qualquer tipo de controlo”.
“Mais um ano ou dois e depois fecho”
Comprar pinhas e pinhões, tratá-los e revendê-los foi, durante muitos anos, o negócio de António Romão, dono de uma unidade industrial em Alcácer do Sal. Agora, a fábrica que durante anos tinha sempre vários empregados, só já conta com o patrão. “É mais um ano ou dois, e depois fecho”, disse ao Semmais.
“É verdade que falta a água, mas acho que as alterações climáticas são a causa principal para a crise grande que vai no setor”, afi rma. “Às vezes olhamos para as árvores e vemos as pinhas todas secas. Dantes lidávamos na fábrica com milhões de pinhas, agora são apenas uns milhares e, às vezes, nem sequer chegam a isso. Talvez umas 500 ou 600”, acrescentou o mesmo empresário.
António Romão diz que já nem se preocupa em encontrar quem apanhe as pinhas que ainda sobrevivem às maleitas que vão corroendo a saúde dos pinhais devido à falta de água ou à sua queda em momentos fora de época. “Não é viável em termos económicos. O dinheiro não estica. Agora só trabalho eu e, mesmo assim, sou um patrão sem vencimento. Tento retirar o dinheiro para a Segurança Social e não posso fazer mais nada, para não fi car totalmente descapitalizado”, referiu.
“Já lá vai o tempo em que em Alcácer havia muita gente a viver das pinhas e dos pinhões. Agora, tirando eu, só já há mais uma pessoa que trata do assunto. Todas as outras pequenas fábricas que por aqui existiam já fecharam. E até outras maiores, em Coruche, em Pegões e, pelo menos 12 em Espanha, já tiveram de fechar as portas”, concluiu.
Três albufeiras não atingiram metade da capacidade
Apesar da quantidade de chuva originada pela depressão Cláudia, três das nove albufeiras da Bacia do Sado apresentavam, na quarta-feira da passada semana, volumes de água abaixo de metade das respetivas capacidades. A situação não é, para já, de alarme para os agricultores da região que, no entanto, temem que a água armazenada possa não chegar para as culturas de verão. De acordo com o portal Barragens.pt, era a seguinte a situação de cada uma das nove albufeiras:






