Autodeterminação dos mais velhos na era COVID19

No contexto do Covid19, é pertinente falar das pessoas idosas e do modelo de sociedade que temos, mas sobretudo daquele que pode emergir desta experiência pandémica.

Em 1961 em Portugal havia 27,5 idosos por cada 100 jovens e a esperança média de vida estava perto dos 65 anos. Hoje há 157,4 idosos por cada 100 jovens e a esperança média de vida é de mais de 80 anos.

A realidade mudou radicalmente em 60 anos e hoje Portugal é o 3º país mais envelhecido da Europa, depois da Itália e da Alemanha. Esta realidade levanta-nos desafios a que temos que saber responder no atual contexto, sem pôr em causa direitos, liberdade e garantias dos cidadãos mais velhos.

O vírus com que lidamos é mais violento junto da população idosa, o que tem levado a uma política de saúde pública que tem como princípio o confinamento e a proteção das pessoas a partir dos 70 anos. Durante o Estado de Emergência havia mesmo especial dever de confinamento deste grupo de cidadãos e no que diz respeito às pessoas idosas institucionalizadas em lares residenciais a total ausência de visitas de familiares e amigos.

Segundo os dados da Carta Social existem no Distrito de Setúbal, entre lares do setor solidário e do setor lucrativo, 143 respostas residenciais com capacidade para 5.882 pessoas. Estas estruturas, a que se juntaram os lares ilegais, que não se sabe o número exato pela sua condição, tornaram-se uma das principais preocupações no âmbito da estratégia de combate ao coronavírus.

Está neste momento a decorrer a testagem a todos os funcionários e funcionárias destas estruturas, independentemente da sua situação jurídica, para que se possa avaliar o risco de contágio. Esta medida é uma aposta decisiva no combate á pandemia na Região. Estão envolvidas nesta ação, a Segurança Social, a Saúde, as Câmaras Municiais através da Proteção Civil de cada Município e as entidades de Ensino Superior.

A estratégia de testar, testar, testar, vem garantir a monotorização desta população e evitar situações dramáticas, como se tem vivido noutros países. Mas este controlo tem que servir para mais.

As pessoas idosas são cidadãs de pleno direito e, não estando interditadas, têm todo o direito à autodeterminação, direito de decidirem sobre as suas vidas. O que lhes deve ser pedido é que, dado a sua especial fragilidade perante a doença, tenham as devidas precauções.

Não é aceitável numa sociedade decente, que por tempo indeterminado, as pessoas idosas institucionalizadas sejam impedidas de estar com aqueles que amam. É fundamental que após as testagens dos lares se encontrem soluções para que estas pessoas possam ser visitadas, com os cuidados devidos de distanciamento social e higienização dos espaços.

Mas também aqueles que não estão institucionalizados têm direito a viver e a optar sobre o que querem e não querem fazer. Há muitas pessoas com mais de 70 anos com vidas ativas, muitas que trabalham ou têm atividades sociais, muitas que tomam conta dos netos, e não é aceitável que lhes seja vedada a possibilidade de viver.

Temos que garantir que as pessoas idosas possam fazer as suas escolhas em liberdade, observando regras de segurança adaptadas a cada situação, mas que não permitam o caminho de uma sociedade em que os mais velhos sofram de solidão e de tristeza, porque uma doença tornou as medidas sanitárias em medidas discriminatórias contra pessoas que tal como todas as outras têm direito à vida e a serem felizes.

ATUALIDADE
Catarina Marcelino
Deputada do PS
Ex-Secretária de Estado para a Cidadania e para a Igualdade