No Centenário de José Saramago (porque é em Novembro)

Suspeite-se do verbo, mas calhou ser em Almada que estiveram, a 8 de Março de 2014, por iniciativa do Movimento Democrático de Mulheres (MDM), Jadiyetu Ahamed, da Direcção da União Nacional das Mulheres Saharuis, na Sala Pablo Neruda; e dois dias depois, a convite do Núcleo de Almada da Associação de Amizade Portugal-Cuba (AAPC), na Sala Experimental, Elizabeth Palmero, companheira de um dos três cubanos que os EEUU mantinham encarcerados ilegalmente.

Salas ligadas entre si pela rua que une o Forúm Municipal Romeu Correia e o Teatro Municipal Joaquim Benite.

Retemo-nos neste, porque a 27 de Fevereiro (jornada de luta da CGTP-IN em Lisboa e no Porto) tivera lugar a segunda libertação que permitiu o imediato regresso a casa, a Cuba, de um dos Cinco heróis, Fernando Gonzales.

A partilha da alegria desta vitória levou ao Teatro dezenas de pessoas mobilizadas pela União dos Sindicatos de Setúbal, a Associação de Colectividades do Concelho de Almada e os Núcleos Locais do CPPC (Conselho Português para a Paz e Cooperação), do MDM e da URAP (União dos Resistentes Antifascistas Portugueses). Era dia de descanso, mas o Teatro abriu portas, não se esvanecendo contudo uma amargura: “a libertação é só uma, dos Cinco, para os Cinco, só para os Cinco. Revolta sempre, rejeição até ao fim!”

Foi por isso redistribuído o postal a enviar para The White House, 16000 Pennsylvania Ave, Washington, DC 20500, United States, subscrito havia anos por 10 Prémios Nobel, entre os quais José Saramago, exigindo o reencontro com os seus familiares de António, Fernando, Gerard, Ramón, e René, dependente da assinatura do carcereiro (“Aguardamo-la”), e cujos efeitos de campanha de solidariedade se concretizou pela colagem, aos milhares, entre nós, de selos a comprar dos CTT.

Em 2000, o Prémio Nobel da Literatura de que falámos deu a saber: “Há algum tempo, quando me manifestei publicamente a favor dos trabalhadores sem terra, o Presidente do Brasil, sr. Fernando Henrique Cardoso, embora sem citar o meu nome, aconselhou-me a que me ocupasse dos assuntos do meu país e deixasse o seu em paz. Não lhe faço a vontade. A mundialização quando nasce, senhor presidente, é para todos. Por muito que lhe desagrade, o seu Brasil, os sem terra seus compatriotas e a justiça que os condena fazem parte do meu mundo. Suporte-me, ainda que lhe custe. E permita-me que lhe pergunte se conseguiu dormir todas estas noites em sossego depois de José Rainha ter sido condenado a 26 anos e 6 meses por um crime que não cometeu”.

José Rainha Júnior, dirigente do Movimento dos Sem Terra, haveria de ser, enfim, absolvido, prova de que, voltando às palavras do escritor comunista português, “não nos é permitido desanimar na batalha pela dignidade do ser humano. Perderíamos tudo, se a perdêssemos”.

Os postais – que o mais certo é não terem chegado a Obama mal o Atlântico Norte ficou para trás – no nosso país, emitidos em múltiplos marcos e caixas de correio, passaram por não poucas mãos de trabalhadores dos CTT. Um grupo deles interpretou Saramago, “o internacionalismo também é connosco”!, foi a um Centro de Trabalho do PCP e pediu: “Dêem-nos um molhe, também vamos assinar e enviar”.

Política e Cultura
Valdemar Santos
Militante do PCP