Boicote à Rússia deixa em aberto utilização de Sines para receber gás para Europa

A possibilidade de os navios fazerem a descarga na cidade já foi aventada na União Europeia há dois anos. Há, no entanto, quem duvide das condições de armazenamento e tema os custos de transporte até França.

Poderá o porto de Sines ter condições para, a médio prazo, receber o gás que depois será canalizado para a Europa, servindo assim de alternativa ao Nord Stream 2, o projeto que previa a construção da estrutura que faria o abastecimento da Rússia para a Alemanha e que agora foi suspenso como medida de retaliação económica face à iminência de agressão armada russa à Ucrânia? A resposta da administração da infraestrutura portuária é “sim”.

“A União Europeia fez uma abordagem nesse sentido há cerca de dois anos e nós, administração do porto de Sines, entendemos que é possível recebermos nas nossas instalações o gás que poderá posteriormente ser enviado para a Europa. Analisámos o assunto e concluímos que sim”, disse ao Semmais o presidente do Conselho de Administração, José Luís Cacho.

Sem se alongar mais sobre o tema, o mesmo responsável disse que existem condições de armazenagem (o porto de Sines possui atualmente três depósitos de grandes dimensões) e também para receber os navios que chegariam de destinos prováveis como o Qatar, a Austrália ou os Estados Unidos da América, que a par da Rússia são os maiores produtores mundiais de gás natural.

 

Observadores falam em custos quase insuportáveis

No entanto, segundo o parecer de outras entidades contactadas pelo Semmais que, pediram anonimato, a tarefa acarretaria custos quase insuportáveis. “Penso que utilizar Sines como ponto de abastecimento da Alemanha e de outros países europeus apenas iria ajudar a solucionar uma ínfima parte do problema. O porto de Sines tem três grandes depósitos, mas, certamente, os mesmos não seriam suficientes para armazenar todo o gás. Depois, seria necessário criar condições em terra para transformar o gás que aqui chegaria em estado líquido e que teria de ser modificado. Por fim, havia também a considerar a passagem dos Pirenéus e, por fim, a entrada do gás nos equipamentos franceses, sendo que neste país poderiam fazer-se ‘estrangulamentos’, impedindo a passagem ao ritmo desejado e criando desse modo mais dificuldades de armazenamento em território nacional”.

A possibilidade de Sines ser utilizado para receber o gás que vai para a Europa é também vista com alguma desconfiança por outros observadores, que lembram que a hipótese do porto (o único de águas profundas existente no país) é apenas “uma entre sete que existem na Península Ibérica”. “Estamos a esquecer que Espanha tem seis portos preparados para receber essa mesma solução”, lembrou.

Outra fonte lembra, no entanto, que o porto de Sines já recebe navios com gás proveniente dos Estados Unidos e que, portanto, já existem estruturas capazes de acolher a operação. “Resta saber que custos acarretaria um projeto de tal dimensão e como seria o mesmo financiado”, disse.

A Alemanha é o principal consumidor do gás russo, absorvendo atualmente cerca de 40 por cento do total das exportações daquele país.