Obrigados à política da estabilidade

Passados cem dias de governação pouco ou nada mudou, a não ser que os dois principais partidos do espectro político nacional continuam colados um ao outro, a fazer fé nas sondagens.

Face a esta divisão de partidarismo na cena atual (não esquecendo a força e o peso que o eleitorado deu ao Chega) impõe-se que tanto PSD quanto o PS assumam duas premissas essenciais, sem perder a face das suas diferenças insanáveis, mas escutando o povo de uma forma mais condizente com a leitura que os portugueses fazem da realidade.

O PSD ganhou as últimas legislativas, por pouco, é verdade, mas ganhou. Deve liderar o Governo, como o está a fazer. O PS perdeu as eleições, por pouco, é verdade, deve liderar a oposição, como o está a fazer.

Não é crível que se vejam forçados a executar exercícios diferentes. Um a fazer o trabalho do outro e vice versa.

Estando tão empatados e obrigados a trabalhar, nomeadamente no Governo e na oposição, os dois partidos precisam de encontrar alguns equilíbrios e isso não tem acontecido. Agora que se aproximam as discussões sobre o próximo orçamento, e tendo em conta que o Presidente da República já iniciou a sua vaga de chantagens, proclamando a abertura de uma nova legislatura em caso de reprovação do documento, é preciso muito tino.

As duas condições essenciais são as seguintes. Montenegro, que até diz que está a trabalhar para além dos powerpoints, tem que deixar de zurzir do último governo e abandonar de vez a arrogância política. Não, não é o melhor Governo da história recente. E, sim, há muito trabalho feito pelo seu antecessor. Que aproveite, melhore, imponha as suas linhas mestras e depois submeta-se a votos, preferivelmente daqui a quatro anos, mais coisa menos coisa.

Por seu turno, os socialistas, liderados por Pedro Nuno Santos, têm que dar espaço a quem governa para mostrar o que vale, criticar e lutar pelas suas bases políticas, sem linhas vermelhas ou de outra cor que seja. E mais, PNS não deve cair na tentação de deixar passar em claro, todos os dias, que o governo de que fez parte foi o pior governo da história recente. Não, não foi. E os portugueses sabem disso. E, depois, preferencialmente daqui a quatro anos, mais coisa menos coisa, ir a votos com as ganas que diz ter.

Ambos, na verdade, têm a responsabilidade de não deixar espaço livre aos populistas do Chega, e prepararem-se para o que tem sido a nobreza do nosso sistema que é a alternância democrática.

Os portugueses querem, sobretudo, estabilidade política. E só estes dois partidos a podem oferecer, entre as causas comuns e as diferenças. Ainda bem que assim sucede.