O PROCESSO de descentralização de competências para os municípios, tem sido, desde a sua génese, mal gerido. Um verdadeiro processo de descentralização não se resume a uma pura transferência de competências entre a Administração Central e Administração Local, ainda por cima sem recursos.
Um verdadeiro processo de descentralização implica a preservação da autonomia administrativa, financeira, patrimonial, normativa e organizativa interna das autarquias locais; implica a garantia do acesso universal aos bens e serviços públicos necessários à efetivação de direitos constitucionais e a universalização de funções sociais do Estado; implica a coesão nacional, a eficiência e eficácia da gestão pública; implica a clareza na delimitação de responsabilidades e a adequação dos meios às necessidades, por fim, obrigatoriamente, implica a estabilidade de financiamento no exercício das atribuições que lhes estão cometidas. Um verdadeiro processo de descentralização implica o poder de execução, mas implica igualmente o poder de decisão, de planeamento e programação.
É preciso esclarecer: descentralizar sim, desde que existam meios técnicos e financeiros ajustados às necessidades. As autarquias não são, e não podem ser, simples tarefeiros de matérias cujo Estado Central pretende descartar. A descentralização de competências só pode ter um objetivo, o de beneficiar as populações, e com o atual modelo que o governo pretende implementar, o que está em causa é exatamente o contrário.
Na saúde, a competência das autarquias deve centrar-se na prevenção da doença e na implementação e promoção de projetos de estilos de vida saudáveis, e não na gestão de cuidados de saúde primários. A verdade é que nenhum dos atuais problemas dos Cuidados de Saúde Primários vai ser resolvido com esta transferência, logo o que se vai transferir será o problema para outra entidade que também não terá a capacidade para os resolver.
No concelho do Seixal, com 170.000 habitantes, existem nove instalações de saúde e regista-se um défice de três equipamentos, para além da falta médicos e enfermeiros de família, deixando 40.000 utentes sem o devido enquadramento. Segundo o mapa do governo sobre as despesas para as instalações já existentes, foram gastos em 2018 zero euros em seguros dos estabelecimentos de saúde; 492€ em arranjos exteriores; 871€ em manutenção de elevadores; 1053€ em manutenção de sistemas de deteção de incêndios e extintores, entre outros.
Se adicionarmos os valores que o governo propõe transferir para a conservação e reabilitação destas nove unidades, chegamos à soma de 123.365€, que se dividirmos por nove totaliza 13.700€, por cada uma, por ano.
Tendo em conta que estimamos uma necessidade de investimentos imediata de cinco milhões de euros, para a requalificação destas instalações de saúde, podemos concluir que seriam necessários cerca de 40 anos para perfazer esse montante.
Em janeiro quando participei na conferência «Os Caminhos da Descentralização», no Porto, ficou clara a rejeição massiva das autarquias a um processo de enfraquecimento do Poder Local Democrático. O que está agora perto de se tornar realidade é a suspensão do modelo de descentralização proposto pelo governo de forma a que este possa ser renegociado.
Congratulamo-nos com isso e esperamos que esteja para breve, para que a descentralização possa avançar e que da mesma resultem benefícios claros para as populações.
SIGA O NOSSO CONCELHO
Joaquim Santos
Presidente da CM Seixal