O autarca deverá ser chamado a depor numa comissão parlamentar. Serviços de segurança seguem, há vários anos, leque alargado de russos residentes em todo o país.
O presidente da câmara de Setúbal recusou apresentar o pedido de demissão sugerido por deputados do PSD na sequência da polémica resultante da alegada cedência de dados pessoais de refugiados ucranianos a cidadãos russos que trabalharam com o município e, supostamente, também com o Governo de Vladimir Putin. O autarca setubalense, eleito pelos Verdes numa lista da CDU, recusou, para já, dar conhecimento aos pares da vereação qualquer esclarecimento relativo ao processo de averiguações em curso e decretado pelo Estado.
Na quarta-feira, durante a reunião de câmara, André Martins, deixou sem resposta as questões colocadas pelos vereadores do PSD, Fernando Negrão e Sónia Martins, e do PS, Fernando José, declarando apenas que não iria dar qualquer esclarecimento relativo ao processo, uma vez que decorrem averiguações por parte de um órgão estatal, que tanto pode ser a Inspeção Geral das Finanças como a Comissão Nacional de Proteção de Dados.
Sem acesso a qualquer outro depoimento do município, o Semmais sabe, no entanto, que André Martins e os seus pares não são os alvos para já das averiguações que, entretanto, foram intensificadas pelo Serviço de Informações e Segurança (SIS). Fonte contactada garante que o casal russo que liderava a associação Edintsvo, sediada em Setúbal e que receberia contrapartidas financeiras do município, está há muito referenciado, assim como outros cidadãos do mesmo país que, eventualmente, estejam a recolher dados pessoais de refugiados ucranianos para os enviarem para Moscovo.
“É impossível vigiar os cerca de 5.100 russos que atualmente vivem legalmente em Portugal, mas é evidente que o Estado sabe quais são as atividades a que muitos deles se dedicam, assim como houve especiais cuidados com a aceitação dos pedidos de proteção temporária efetuados desde que a guerra se iniciou”, referiu a mesma fonte, salientando que “naturalmente foram intensificadas as medidas convenientes a partir do momento em que, em Lisboa, os dados pessoais de manifestantes anti Putin foram recolhidos e enviados para o Governo russo. Há uma natural preocupação com este caso, assim como existe em relação a outras situações”.
Muitas perguntas ainda sem esclarecimento
No caso de Setúbal é preciso saber se Igor Khasin e a sua mulher, Yulia Khashina, que trabalhava no município, atendendo os refugiados ucranianos, chegaram efetivamente a dar descaminho aos dados pessoais dos ucranianos. Essa é uma questão fundamental e à qual o presidente da autarquia ainda não deu resposta.
O que se sabe é que André Martins, na sequência da divulgação do caso, tratou de dotar a autarquia com um responsável pela Proteção de Dados Pessoais, cargo que estava previsto legalmente desde 2018 mas que, por motivos nunca explicados, nunca foi criado. “Não havia em Setúbal e não existe, se calhar, em 90 por cento das câmaras municipais”, disse ainda a mesma fonte contactada pelo Semmais.
As eventuais respostas a muitas das questões colocadas a André Martins serão, possivelmente, dadas na Comissão Parlamentar de Direitos, Liberdades e Garantias, para onde o social-democrata Fernando Negrão já fez questão de dizer que pretende convocar o presidente da câmara de Setúbal.
Os representantes do PSD e do PS pretendem saber, sobretudo, se o presidente do município terá facilitado a atuação do casal russo numa alegada recolha de dados pessoais (cópias de documentos de identificação e local de residência de ucranianos que terão ficado a combater no seu país), ao mesmo tempo que pretendem saber quais os contornos reais do protocolo que previa que a edilidade abonasse, anualmente, a associação Edintsvo com cerca de 90 mil euros.