Embarcações elétricas estão a chegar, mas não há tripulantes

Os navios elétricos serão uma realidade já a partir de 2023. A Transtejo já adjudicou a construção de quatro estações de carregamento, no valor de 14,4 milhões de euros. Utentes e sindicatos alertam, no entanto, para a progressiva deterioração das existentes e para a falta de tripulações.

Pelo menos um dos quatro postos de carregamento da frota elétrica da Transtejo irá estar operacional até junho do próximo ano, altura em que deverão também chegar as primeiras quatro embarcações. Adjudica- das por 14,4 milhões de euros, as estações de carregamento ficarão instaladas no Cais do Sodré (Lisboa), Cacilhas, Seixal e Montijo. Este é um primeiro passo da empresa para reduzir os níveis de poluição. Até 2024 deverão estar ao serviço dez embarcações totalmente movidas a energia elétrica.

Segundo foi adiantado ao Semmais pelos serviços de imprensa da Transtejo, para que possa ter início a construção das estações de carregamento basta agora a obtenção do visto do Tribunal de Contas, o qual deverá ser emitido até 30 de outubro. A construção das estações de carregamento fica a cargo do agrupamento CME – Construção e Manutenção Eletromecânica, SA / Sociedade de Empreitadas e Trabalhos Hidráulicos.

A Transtejo explicou ainda que o custo das dez embarcações, que estão a ser construídas no estaleiro Gondán SA, nas Astúrias, Espanha, é de 52,440 milhões de euros. Estes navios, que são totalmente movidos a energia elétrica, têm capacidade para transportar, cada um, 540 passageiros, os quais viajarão distribuídos por dois salões. A bordo existem também lugares para pessoas com mobilidade reduzida, bem como espaços destinados ao transporte de, pelo menos, 20 bicicletas. Os navios têm 40 metros de comprimento total e 12 metros de largura.

“A chegada dos quatro primeiros navios da nova frota elétrica encontra-se prevista para o período entre dezembro de 2022 e junho de 2023. Outros quatros navios chegarão até final do próximo ano, e os últimos dois navios, que completam o projeto, serão recebidos em 2024, sendo que as baterias de energia serão fornecidas em paralelo à entrega dos navios. A entrada ao serviço ocorrerá após a sua chegada e a formação das respetivas tripulações”, informou ainda a transportadora.

Esta nova frota ambientalmente sustentável, ainda de acordo com a Transtejo, possui um sistema de propulsão 100 por cento elétrico, “com consumos energéticos inferiores aos dos navios atuais e sem emissões de gases de efeito de estufa (GEE)”. A empresa refere, por outro lado, que em 2019 o consumo de gasóleo das embarcações que fazem a ligação entre as duas margens do Tejo foi de cerca de 5.249 milhões de litros de gasóleo, o qual teve uma correspondência de emissão de CO2 na ordem das 13.122 toneladas.

Após dois anos marcados pela pandemia de covid-19, a Transtejo, que assegura as ligações fluviais entre Lisboa e o Seixal, Montijo, Cacilhas e Trafaria/ Porto Brandão (a Soflusa é responsável pelo trajeto entre o Terreiro do Paço e o Barreiro) está agora empenhada em recuperar o volume de passageiros trans- portados. Os números das duas transportadoras referem que entre 2013 e 2019 os frequentadores dos seus navios passaram de 15,2 milhões para 19,3 milhões. Já em 2020 e 2021 foram transportados, respetivamente, 10,7 e 10,6 milhões de pessoas.

Comissão de utentes diz-se satisfeita mas desconfiada

Os números e datas agora revelados pela Transtejo motivam, para já, o aplauso da Comissão de Utentes da Margem Sul que, no entanto, deixa um alerta: “Esperamos que não sejam apenas mais anúncios cuja concretização é depois adiada”.

“A verdade é que tudo isto é desesperante. O estado a que chegou esta situação, com embarcações e cais de embarque cada vez mais degradados, é inaceitável”, disse ao Semmais o responsável daquela comissão de utilizadores, Marco Sargento. “Vemos constantes anúncios, mas, infelizmente, não assistimos à concretização das medidas necessárias”, adiantou.

Marco Sargento, esmiuçando uma das várias razões de protesto, deu o caso de Almada, onde se processa o único transporte para a margem oposta de veículos automóveis até 50 centímetros cúbicos. “São viaturas que estão impedidas de circular na ponte e que servem de transporte para um grande número de pessoas.

Acontece que, por falta de manutenção das embarcações, mas também porque muitas vezes não existem mestres e outro pessoal de bordo em número sufi- ciente para operarem, as ligações acabam por ser suprimidas. É um problema recorrente e que acaba por penalizar muito uma elevada quantidade de utentes”, disse.

Por outro lado, tanto os utentes assim como os sindicatos representativos dos trabalhadores das transportadoras têm vindo a alertar para o decréscimo de pessoal de bordo, nomeadamente de mestres, os quais são fundamentais para que as embarcações possam operar. “As saídas, motivadas pela reforma, não têm sido compensadas. Para se poder navegar é necessário que existam mestres, e estes já são muito insuficientes”, referiu ainda o representante dos utentes.

Faltam 60 trabalhadores

A FECTRANS, estrutura sindical onde se incluem os trabalhadores da Transtejo, diz que atualmente a empresa tem um deficit de 60 funcionários. “Entre os administrativos e os operacionais há uma falta de 60 pessoas. Deveriam ser 304, mas são apenas 244. Sabemos que a empresa pretende preencher as vagas, mas para que tal possa acontecer é necessário o visto do Ministério das Finanças”, disse ao Semmais o sindicalista Carlos Costa. O mesmo responsável, pronunciando-se sobre a frota elétrica anunciada, referiu que “vão faltar tripulações”. “Com a chegada dos novos navios serão necessárias mais seis tripulações, sendo que cada uma delas deverá ter mais quatro elementos. Até ver estas carências não estão a ser colmatadas”, afirmou.