Maçã riscadinha em risco de extinção

Só dois produtores entregaram para comercialização um dos frutos ícones do concelho de Palmela e do distrito de Setúbal. A reconversão das vinhas levou ao abate de muitas macieiras. Técnicos e produtores dizem que é preciso maior valorização.

A maçã riscadinha de Palmela, um dos frutos emblemáticos do concelho e do distrito, pode estar à beira da extinção. Este ano a Cooperativa Agrícola União Novense, de Pinhal Novo e a única entidade que comercia- liza o produto coletivamente, recebeu apenas entre 1,5 a 2 toneladas. Apenas dois agricultores se apresentaram para entregar um produto que, para se salvar, precisa de promoção e consequente valorização.

“Não é descabido admitir que a maçã riscadinha possa desaparecer do mercado. Este ano apenas só foi distribuída, via Cooperativa Agrícola União Novense, para uma única rede de supermercados. Sabemos que existem alguns produtores que, individualmente, entregam os seus frutos diretamente no mercado, mas isso, quantitativamente, não é muito significativo.

A riscadinha pode estar mesmo em risco de extinção”, admitiu ao Semmais o técnico daquela cooperativa, José Caleiro.

Há, pelo menos, três aspetos que podem estar a contribuir para o desaparecimento deste fruto. José Caleiro explica que em primeiro lugar está, possivelmente, a norma legal que proibiu a existência de árvores, entre elas as macieiras, entre as vinhas. “A reconversão da vinha assim o ditou e, em consequência, diminuíram as árvores de fruto”, disse. Depois, ainda segundo o mesmo responsável, os agricultores podem estar a abandonar este fruto por o mesmo se encontrar muito desvalorizado. Por fim, mas não menos importante, há também o registo da dificuldade de conservação deste tipo de maçã.

“Neste momento a cooperativa paga aos produtores cerca de um euro por quilo de riscadinha. Os produtores queixam-se da baixa valorização, lembrando que se trata de um produto mui- to apreciado”, explicou o técnico.

Já em relação aos problemas de conservação, José Caleiro lembra que a riscadinha “não aguenta ir ao frio” e que deve ser consumida logo após a colheita, o que acontece entre a terceira semana de julho e a terceira de agosto. “É um produto de qualidade, mas que precisa de ser valorizado.

Algum desse trabalho está a ser desenvolvido pela câmara de Palmela, que vai divulgando receitas e que tenta manter vivo um produto regional muito apreciado localmente. Há, por exemplo, alguma divulgação nas feiras locais, mas isso pode não ser suficiente. Este ano, por exemplo, o calor verificado em julho terá queimado muita da produção e esse foi mais um fator que contribuiu para a pouca visibilidade do produto”, lembrou o mesmo perito, salientando que ainda não se conhece o valor exato das quebras produtivas de 2022.

Chegou a dar nome a ruas e às 20 toneladas no mercado

A Cooperativa Agrícola União Novense, conforme adiantou José Caleiro, chegou a comercializar anualmente 12 toneladas deste fruto. Já a extinta cooperativa de Palmela, que anteriormente era responsável pela recolha e venda, teve anos em que colocou no mercado cerca de 20 toneladas.

“Neste momento a riscadinha é, praticamente, vendida no concelho de Palmela. Houve anos em que se efetuaram vendas para o Algarve e para o Porto mas, face ao decréscimo da produção, esses mercados perderam-se. Agora, para retomar os valores antigos, é necessário um grande investimento. É preciso que exista uma boa linha de escoamento e que se conquistem mercados que não sejam apenas os de proximidade”, disse ainda o mesmo responsável.

A maça riscadinha de Palmela é um produto com classificação DOP (Denominação de Origem Protegida) a qual foi atribuída em novembro de 2013 pela União Europeia. O seu surgimento terá ocorrido no século XIX, no Lugar de Barris, vindo rapidamente a conhecer um grande aumento produtivo no concelho. O seu peso económico foi de tal modo importante, que chegou mesmo a dar nome a dois arruamentos em Palmela e Pinhal Novo.

A riscadinha de Palmela foi, durante muitos anos, um fruto que rivalizou no concelho com a maçã-espelho, uma variedade que era igualmente muito apreciada, sobretudo pelas diversas variações culinárias que permitia (desde ser assada até à utilização na doçaria e bolos) e que chegou mesmo a ser exportada para Inglaterra. Hoje dificilmente se encontra um pomar deste fruto.