No primeiro arranque desta legislatura, com a eleição do presidente da Assembleia da República, podemos assistir ao saco de gatos em que se está a transformar a cena política em Portugal.
Não é nada que não se antevisse. Seria, aliás, expetável que perante o empate técnico entre AD e PS resultante das eleições de 10 de março, e com a robustez alargada do grupo parlamentar do Chega, o país ficasse, até ver, ingovernável. É pena.
Este nosso futuro próximo ficou assim muito incerto, porque vai depender, e muito, de políticos pouco confiáveis e agendas duvidosas, não totalmente ligadas aos problemas que, segundo ditou o voto popular, precisam de resolução urgente.
Se a ideia era mudar, que fosse (ou seja) para melhor. Ao votar maioritariamente à direita, os portugueses misturaram esse alegado voto de mudança com o voto de protesto, alimentando um caldo perigoso que baralha todas as expetativas.
Convém referir que essa má leitura foi iniciada pelo Presidente da República que deu o empurrão final para que o anterior ciclo político quase nem chegasse a meio caminho. É certo que Marcelo se viu obrigado a tomar decisões, com a demissão prematura e irrevogável de Costa. Mas podia ter ouvido a voz da consciência, do bom-senso, e até do (seu) Conselho de Estado, deixando que o anterior governo, maioritário, terminasse a ronda, para que depois os portugueses pudessem ajuizar o trabalho final. Mas isso é história.
O que importa agora é encontrar a mínima estabilidade política, legislativa e de governo, premissas que, pelos primeiros embates, não auguram nada de bom. O que manda a democracia é que as diferentes forças políticas exerçam as suas duas funções sacramentais, governar e fazer oposição, em consonância com os resultados eleitorais.
Parece no entanto, que será muito difícil encontrar equilíbrios nesta legislatura forçada, tendo em conta as vontades de uma bancada parlamentar extremista, a do Chega, que navega bem neste quadro politicamente incipiente com que estamos confrontados.
Os últimos dias já cheiraram a eleições antecipadas, desfecho que todos preveem mas que nunca será bom para o país. O pior que pode acontecer, é o país passar a andar consecutivamente em brasas, com o partido de Ventura sempre pronto a detonar a bomba, porque se sente à vontade e crente de que uma nova ida às urnas lhe trará mais votos e mais força.
Difícil esta equação, fora de controlo dos partidos do arco democrático, e sob a pressão de uma nova força de bloqueio que, infelizmente, mimetiza o crescimento do radicalismo político que tem galgado na Europa.
Estamos perante uma provação enorme, que vai justificar muito diálogo e muita responsabilidade, desde logo sobre as questões de Estado, aquelas que, por ventura, implicarão concertação e acordos alargados, por exemplo, na Saúde, na Educação e na Justiça.
E, claro, os 50 anos do 25 de Abril não mereciam esta espécie de balcanização da política portuguesa, nem estes laivos perniciosos das gincanas latino-americanas que assombram agora o nosso sistema.