Assume a sua filiação política, mas deixa claro que é um candidato acima das forças partidárias. Tem uma visão estratégica que passa por uma CCDRA mais atuante e reivindicativa e não “apenas um veículo de distribuição de fundos”, porque diz ser urgente concretizar projetos estruturantes e apostar na internacionalização.
Teve um tempo para digerir a hipótese de avançar com esta candidatura, a convicção era já muita ou houve algum click na decisão?
Nunca coloquei de parte a candidatura à liderança da CCDRA, desde que fosse num processo eletivo e não por nomeação. Portanto, desde algum tempo vinha a maturar esta possibilidade, e logo que o Governo tomou a decisão de ser por eleição aclarou essa vontade. Mas, porque não vivemos sozinhos na sociedade, quis ouvir um conjunto de pessoas com bastante mais-valia na região e deixar que o processo se desenrolasse nos locais próprios.
Presumo não ter sido fácil, tendo em conta tanto tempo passado à frente da Entidade Regional de Turismo, setor pelo qual se disse sempre apaixonado?
Tem a ver com ciclos. O turismo continua a ser uma paixão, mas também sou apaixonado pelo desenvolvimento e pelo Alentejo. Trata-se, neste caso, de abrir um novo ciclo profissional, onde posso ser útil à minha região. É também muito desafiante em termos pessoais.
Há pouco falou que ouviu pessoas e que o processo se desenrolou nos locais próprios, neste caso está a falar das estruturas do PS?
Deixe-me dizer-lhes primeiro que isto de se falar em candidaturas independentes não deixa de ser um bocado humorístico, porque obviamente que estas candidaturas têm um suporte de origem partidária. E a independência, a meu ver, é a forma como faz o exercício do cargo, postura que sempre demonstrei tanto à frente do turismo da Serra de São Mamede, como nos doze anos de liderança da ERT, com independência, isenção, grande proximidade a todos os autarcas e a todos os agentes económicos independentemente dos seus quadrantes partidários, bem como estar acima de todos os interesses. Aliás, como sabe, fui sempre eleito por unanimidade.
Está a referir-se à posição do seu adversário declarado?
Não queria falar muito sobre esse aspeto da eleição. Mas acho incorreto dizer que somos independentes quando temos uma filiação partidária, e quando se apresenta uma candidatura alicerçada nas comissões políticas distritais do PSD, como acontece com o outro candidato.
No seu caso, deixou claro ser socialista…
Tinha que o fazer. Nunca reneguei à minha filiação partidária, mas sempre me dei bem com todos os autarcas, incluindo os do PSD. Estou perfeitamente à vontade nesse sentido. A verdade é que fui ganhando apoio dos autarcas do PS e de muitos outros com outras ligações partidárias.
Mas a sua candidatura é uma candidatura socialista?
Aproveito para explicar que vivemos num sistema democrático e, de acordo com o processo, os partidos políticos podiam indicar um determinado candidato. Mas, no meu caso, entendi e as próprias estruturas do PS entenderam que a candidatura deveria ser suportada pessoalmente. Portanto não é uma candidatura subscrita ou indicado por força partidária, antes pelo contrário, é suportada por mais de 400 declarações de apoio oriundas de vários quadrantes políticos.
Portanto não foi subscrita, mas é apoiada de forma consensual pelo PS. Não havia outros camaradas seus candidatos ao lugar?
Nunca senti isso. Quando fui abordado, demonstrei a minha disponibilidade. Só isso. Talvez houvesse outras perspetivas mais de ordem regional, mas não plasmada em eventual candidatura. Isso ficou logo superado dentro da estrutura partidária. Repito: O que está em causa neste caso é a isenção que sempre mantive no exercício de todas as minhas funções anteriores, mesmo com domínio total e absoluto do partido a que pertenço, onde sempre decidi que todos deveriam participar nas decisões independentemente das suas relações partidárias.
Estamos a falar de duas entidades com funções e perfil muito diferentes, o que pode trazer de novo à CCDRA?
Em primeiro lugar conheço muito bem a região e duvido mesmo que haja muitas pessoas que conheçam tão bem o Alentejo como eu. De Barrancos à Foz do Arão, de Troia ao fundo da praia da Amália, em Odemira. No total, foram 35 anos de atividade pública, quer como técnico, quer como dirigente. Conheço o território, as pessoas e as suas expetativas, as necessidades estratégias, e tenho uma visão de muitos anos através da ação no turismo, mas também no desenvolvimento regional.
E que visão tem da CCDRA?
Está muito bem definida e é muito concreta, a começar por entender que a CCDRA não pode continuar a ser apenas um veículo de distribuição de fundos comunitários. Os fundos são decisivos, muito importantes, mas precisamos de ir mais além. É necessário que haja um esforço e uma intervenção planeada. É preciso, por exemplo, reforçar o seu escritório em Bruxelas, que deve ser da própria CCDRA, e a partir dali conseguir mais fundos estruturais para o território, reforçando a negociação e o entendimento estratégico com o Governo. Mas também uma grande ligação às autarquias, porque considero que a CCDRA deve ser o grande órgão coordenador das políticas regionais.
Com que abrangência?
Olhe, por exemplo, a CCDR deve colocar na mesma mesa os responsáveis da saúde, da segurança social, da educação e discutir os problemas regionais dessas áreas, para poder exercer influência junto do Governo e acelerar processos e decisões. Veja-se o caso da Covid-19 em que foi necessário criar uma comissão de missão liderada por um secretário de Estado. Se houvessem CCDR’s fortes isso não teria sido necessário!
Por outro lado, a CCDR tem que assumir os grandes projetos estruturantes de abrangência regional. Mas tem que haver um plano. Já há, obviamente projetos assegurados ou praticamente assegurados, como a Barragem do Pisão, mas há que lutar pela ligação da A6 à A23, pela ligação de Sines ao Poceirão e à plataforma logística do Caia, para tornar Sines um grande porto internacional. E isso não está só no meu manifesto está no estudo de Prof. António Costa Silva (autor do Plano de Retoma Económica), porque é consensual que Sines tem que ganhar essa escala e para isso tem que ter mais e melhores acessibilidades. Ou seja, tem que se ligar à Europa e ao Mundo.
As acessibilidades continuam a ser um dos ‘calcanhares de aquiles’ da região?
Claro que sim. Há muito a reivindicar. Não podemos ter no Litoral Alentejano as acessibilidades que temos a partir de Grândola, com vias interregionais naquele estado. É muito complexo, por exemplo, chegar-se a Odemira, os doentes daquela zona demoram uma eternidade até um hospital de referência. O mesmo se passa para chegar a Barrancos ou a Mértola, e não podem continuar a ser territórios esquecidos, pelo que temos que aumentar o nível da reivindicação e lutar por isso. Depois a questão da eletrificação da linha férrea que vai ligar Beja, ou ao aeroporto de Beja por autoestrada.
Aeroporto que continua num certo marasmo em função da utilidade que pode vir a ter no futuro…
Sobre isso não tenho dúvida, faz também parte do meu manifesto. É fundamental que seja um aeroporto alternativo. O Governo tem que estudar se vale a pena investir verbas tão substantivas num novo aeroporto ou se, havendo boas acessibilidades e bons transportes, não o deveria fazer a partir de Beja. Há inúmeros aeroportos por esse mundo fora que ficam a uma hora ou mais das grandes capitais. Beja pode ser uma excelente alternativa.
Vai ser um dos seus cavalos de batalha caso seja eleito?
Esse e outros projetos estruturais, como novo hospital de Évora ou o reforço do Alqueva como polo dinamizador para a região, não só do ponto de vista turístico como agrícola ou agroindustrial. E quero uma grande ligação aos empresários e à academia, pretendo mesmo criar um observatório a nível da região para estudar os indicadores de desenvolvimento.
Estudar os indicadores…
Sim, porque foram já aplicados três quadros comunitários e que indicadores mudaram no Alentejo? Há mais pessoas? Não. Há mais jovens? Não. Há mais empresas? Não. Há mais emprego? Não. Então é porque não foram encontradas as melhores soluções. E temos que as encontrar. Não podemos dizer que temos um desempenho notável e uma gestão notável quando os indicadores se mantêm inalteráveis no que é essencial.
Temos que atrair jovens quadros e fixar pessoas, e por isso é preciso concretizar os tais projetos estruturantes que falei há pouco para dinamizar a atividade empresarial e, daí, gerarmos emprego. É um ciclo vicioso e as ferramentas estratégicas com auxílio da academia ajudarão a definir opções e à tomada de decisões mais assertivas. E isto porque a CCDRA tem que tomar como suas as dores da região. Só distribuir fundos não chega.
Tornar menos máquina e mais política, mais estratégica, é isso?
Claramente, até porque é esse o novo papel atribuído a estes órgãos, que ganham novas responsabilidade a partir do momento em que os seus dirigentes são eleitos. Olhe, por exemplo, as delegações têm que ser mais fortes, e no nosso caso, as de Beja, Portalegre ou do Litoral Alentejano praticamente não existem. O mesmo se passa com o site. Como se pode apostar na cooperação transfronteiriças se não está em espanhol, e como se pode apostar na internacionalização se também não está em inglês? São aspetos que têm que ser corrigidos para tornar a CCDRA mais forte, mais dinâmica e mais atuante.
É com tristeza que tenho constatado que as populações não conhecem este órgão tão importante e decisivo para o desenvolvimento da região.
Mas também é preciso alargar horizontes e ‘vender’ a região ao exterior, apostar na internacionalização, porque somos um território que tem todas as condições de atratibilidade, e mais ainda com investimento fortes nos clusters que importam desenvolver, como a aeronáutica, e outros que vão ser potenciados a partir do momento em que se consiga concretizar as grandes infraestruturas que necessitamos.
CAIXA
A boa herança deixada no turismo
Ceia da Silva diz deixar a Entidade Regional de Turismo do Alentejo / Ribatejo arrumada. E refere que quando assumiu as funções, em 2008, havia um passivo de 12 milhões de euros à banca e ao Turismo de Portugal, derivada do somatório de passivos acumulados. “Neste momento é zero, tanto à banca como a privados”, afirma. E o turismo será sempre um pilar forte da região. “O turismo no Alentejo é o que mais tem crescido no país, onde menos diminuiu face à pandemia, e onde tivemos um agosto melhor do que o do ano passado. Para além de que no somatório registamos um aumento brutal nos últimos anos, com o surgimento de centenas de novas empresas e foram lançados investimentos de grande vulto”, sintetiza.