São muitas as teses que correm sobre André Ventura e o Chega. Vão da aceitação envergonhada à mais enfática repulsa, por significar um pendor populista que não tem encontrado grande chão na nossa já madura democracia.
Sou dos que pensa que Ventura é um logro, um boçal mal amanhado, a roçar o farsante, capaz de dizer tudo e o seu contrário em tempo recorde e mediante o palco e a circunstância. É, por isso mesmo, um oportunista.
Não quero julgar Rui Rio e o PSD pela investida nos Açores, aceite do ponto de vista do jogo de poder e da legitimação parlamentar – até porque Costa abriu o precedente – mas não sei se foi boa ideia.
Ventura parece valer pelo seu partido, mas considero que há muito Chega para além de Ventura. E é esse o perigo. André Ventura é apenas um aventureiro, que não espelha coerência, socorre-se de um discurso opaco, num leito vazio, e que pode esfumar-se na medida da vertigem que lhe deu exposição pública, mas o partido que fundou alberga e esconde gente perigosa.
E não é pela via constitucional que a desdita se afunda, mesmo que o líder Ventura proclame aos quatro ventos e tantos outros oráculos que pugna por uma nova república. Acredito que será sempre combatido pela força da democracia e pelo voto dos portugueses que tem sabido bem discernir sobre ideias e idiotas.
Mas há um papel central que o espectro partidário assente no nosso regime democrático tem inevitavelmente que desempenhar. Não deixar que este espaço sombrio se alargue, sob pena de permitir, por inação, o abrir de um fosso insanável na política portuguesa.
Ventura pode ser um tonto, de ambição desmedida, à procura de um futuro pessoal risonho, sem ciganos, ‘outras raças menores’ como tantas vezes verborreia, e gente desfavorecida ao seu redor, mas a insatisfação, o descontentamento e contestação popular sobre a governação do país e sobre a inconstância das oposições, são seiva da boa para o germinar de bolsas extremistas mais contundentes. A história já nos confrontou com demasiados cenários da mesma nascença.
Raul Tavares
Diretor