A gastronomia e alguns dos mais raros produtos produzidos localmente são cartões de visita de um evento que estimula a economia local e promove o turismo.
Uns chamam-lhe Férrea da Azoia outros dizem que é Camoesa. Quem a conhece gaba-lhe a textura, o sabor, as utilidades gastronómicas e até medicinais. Já esteve quase extinta, mas agora, passados 15 anos, voltou a crescer nos pomares de um peculiar micro clima de Sesimbra. É de uma maçã que falamos, um fruto que pelas suas qualidades únicas é ‘personagem’ central de um evento especial. A 12.ª Mostra realiza-se este fim-de-semana, na Moagem de Sampaio.
As primeiras palavras do vereador sesimbrense José Polido ao Semmais são um alerta: “A maçã Camoesa não é o mesmo que a maçã Riscadinha (do concelho de Palmela). Ambas são raras e de grande valor, mas a Camoesa tem um habitat mais restrito. Cresce na zona da Azoia – e por ser rija, também há quem lhe chame Férrea de Azoia -, Casalinho, Alfarim, Aguncheiras. Tem características distintas, talvez devido ao micro-clima e, há cerca de 15 anos, estava praticamente extinta”.
As origens históricas do fruto são uma quase incógnita. Sabe-se que já foi abundante no concelho, numa época em que era parte integrante da dieta dos locais, uma vez que sendo característico do inverno e devido à sua textura aguentava largas temporadas sem se deteriorar, o que era muito importante numa época em que não havia eletricidade e os modernos métodos de conservação.
O passar dos anos trouxe também novos modos de vida e, com eles, algumas tradições começaram a esvair-se, nomeadamente as ligadas à agricultura, essencialmente de subsistência. Quase sem se dar por isso, as macieiras de Camoesa desapareceram. “Há cerca de 15 a câmara de Sesimbra tomou conhecimento que só já restavam cerca de 150 árvores. Desde então trabalhámos para a recuperação Fizeram-se recolhas de ADN e enxertos. Falámos com produtores e agora, finalmente, já temos alguns pomares e uma produção anual que, estimamos, seja de algumas toneladas Até já temos indicadores clínicos, que referem a Camoesa como muito importante para a prevenção de algumas doenças, nomeadamente a osteoporose”, diz José Polido.
Tradições gastronómicas ajudam turismo
O presidente da edilidade, Francisco Jesus, estima que neste momento existam 30 produtores deste fruto no concelho. Este é um número que, salienta, será capaz de manter Sesimbra na linha da frente no que respeita à preservação de antigas tradições gastronómicas.
“É evidente que o peixe continua a ser a principal referência, mas a maçã Camoesa, o pão, a doçaria – as tamarinas estão em vias de obter certificação – e o vinho dão importantes contributos para cimentar o turismo no território. Hoje o turismo é muito diferente do que acontecia há uns anos e a gastronomia cria uma diferenciação”, adiantou Francisco Jesus ao nosso jornal.
O presidente da autarquia, falando dos projetos municipais tendentes a valorizar os produtos gastronómicos, acabou mesmo por adiantar que em breve, na Mercearia Ideal, gerida pela câmara, será colocado à venda o vinho “Cezimbra”. Trata-se, explicou, de uma produção de 3.000 garrafas e que só foi possível de consumar porque houve o cuidado de envolver produtores e população escolar no projeto.
Na 12.ª Mostra da Maçã Camoesa, Doçaria e Pão haverá ainda espaço para divulgar outros produtos agrícolas que o município tem vindo a ajudar na recuperação.
O vereador José Polido lembra que a maçã não é produto único: “Está em expansão e em breve até poderá surgir em muito maior quantidade, uma vez que o processo produtivo só se concretiza ao quinto ano de plantação. O maior pomar do concelho, por exemplo, ainda não está a produzir. Trata-se de algo que para já é apenas vendido nos mercados locais, mas que já atrai muita gente fora do concelho e até do estrangeiro”.
No espaço da Moagem de Sampaio, que também irá acolher workshops, espetáculos musicais, divulgação de doçaria e sumos de frutos, estarão igualmente em destaque espécies raras como são a Uva de Santa Isabel, a Pêra de Inverno e a Maçã Branca. “É importante dar a conhecer tudo o que aqui se produz. O pão e os queijos, por exemplo, são igualmente diferenciadores e muito importantes na economia local”, refere.
Também a presidente da Junta de Freguesia do Castelo, Manuela Gomes, entende que a mostra é “muito importante para o desenvolvimento do território”. “A câmara regista as marcas, promove os produtos. Existe uma estratégia global, onde se inclui a junta, que visa divulgar a roda dos alimentos que existem em Sesimbra e isso, juntamente com os contactos que se facultam aos produtores, como por exemplo os agricultores, ajuda a valorizar o seu trabalho”, disse a autarca lembrando que a visibilidade já alcançada começou, há vários anos, com o levantamento que envolveu a farinha torrada, que é outro dos símbolos gastronómicos do concelho.