A Europa e o mundo

Para além das questões sanitárias que abalaram a Europa, que não escapou ao rolo compressor da pandemia, abre-se, agora, uma janela de oportunidades para repensar a posição económica do ‘velho continente’ face ao resto do mundo.

Entretidos em crises de liderança e apostados em jogos financeiros de escala perniciosa, nos últimos anos fomos surdos-mudos aos movimentos dos chamados ‘brics’, onde despontaram economias robustas como a China, Índia, Brasil, Rússia ou mesmo a África do Sul. De excedente comercial de 60 mil milhões, em 2015, para um déficit comercial de 24,6 mil milhões, em 2018.

Após a crise das dívidas soberanas, com a economia mundial a crescer em força, a Europa também cresceu, aumentando as suas exportações, mas, ao mesmo tempo, acentuou o fosso da sua dependência externa, com os Estados Unidos e a China a invadirem os nossos mercados nacionais como nunca.

Esta dependência daquela que se diz ser a “maior economia do mundo”, por representar 20% da economia mundial, tem que ser invertida. E este é o momento certo para o fazer.

A economia europeia resistiu à crise financeira de 2008, comparada com outros economias industrializadas, e preservou, nesse período de loucos, a sua posição estratégica no comércio de bens e serviços, mas precisa de produzir mais e esticar a sua consistência nas cadeias de valor. Tem tudo para fazer com que isso aconteça, inclusive capacidade financeira. É preciso estratégia, vontade política e, mais importante, arrasar o fosso que ainda perdura entre os estados-membros.

Este é o desígnio deste século: manter a coesão, consagrar os valores essenciais que a trouxeram até aqui, libertar as tensões que ciclicamente a encaminham para guerras, e cuidar da sua posição no mercado global. A unidade das soberanias não é um fardo, porque já se provou ser possível uma Europa coesa mantendo a identidade dos seus estados. Nem precisamos de voltar aos ideais federais, apenas cumprir os ditames de Adenauer, Churchill, Monnet ou Schuman, entre outros.

E também o mundo precisa de uma Europa forte e relevante, numa altura em que nos vários palcos de outras potências mundiais o vírus do populismo corrói a civilização e desarma as suas conquistas, seja na Organização Mundial de Saúde, seja em relação ao combate às alterações climáticas.

Há tantas razões para que a Europa volte a liderar a bolsa de valores sociais que navegam o mundo, mas para que isso suceda é preciso voltar a ganhar robustez económica que tem perdido e formar líderes capazes de perceber a sua história.

Raul Tavares
Diretor