É notícia por estes dias o surto de coronavírus no Bairro da Jamaica. Imagens do Bairro e entrevistas a moradores mostram bem que o contágio do vírus não é indiferente à pobreza que ali se faz sentir.
A falta de condições habitacionais e de salubridade, a necessidade de continuar a sair para trabalhar, a falta de alternativas, aumentam o risco entre a população que já é sacrificada pela exclusão social.
Muitas das pessoas que vivem nas zonas mais pobres da Área Metropolitana de Lisboa, em que a Península de Setúbal se insere, têm vidas duras, onde a possibilidade de teletrabalho não existe e onde a alternativa ao contágio é não ter comida para pôr na mesa quando ainda há trabalho para fazer.
Um Estudo da Escola Nacional de Saúde Pública, sobre os impactos da Pandemia, vem demonstrar que territórios com mais desemprego e menores rendimentos são mais expostos à doença. Há claramente uma relação entre risco de contágio e baixos rendimentos, mas também efeitos penalizadores no âmbito da crise económica que a pandemia despoletou.
O mesmo Estudo refere que são as pessoas que ganham menos de 650 euros as que mais têm perdido emprego e rendimentos. Mas estamos a falar no plano da economia formal, porque muitas destas pessoas com baixos rendimentos vivem da economia informal, ou complementam o emprego com biscates. De um momento para o outro o trabalho acabou, ficaram sem rendimento e sem qualquer proteção social. Estou a falar de empregadas domésticas, pessoas que tinham atividades no setor do turismo ou da restauração, feirantes e vendedores ambulantes, entre outras.
É importante referir que estas pessoas que vivem da economia paralela não têm acesso ao lay-off simplificado ou às prestações de apoio à família, ou a qualquer outra prestação social. A situação é grave e neste momento a única resposta que têm é o apoio alimentar, cuja procura aumentou exponencialmente. A Cáritas Diocesana de Setúbal viu as refeições distribuídas, passarem de 200 para 600 por dia.
O encerramento das escolas públicas trouxe também um efeito negativo sobre as crianças destas comunidades, porque o acesso a material informático, a internet e a alguém com condições para acompanhar os estudos, é muitas vezes inexistente. A educação é, em condições normais, um dos mais importantes fatores de inclusão social gerador da oportunidade de ascensão social.
Neste momento em que o Governo desenha um programa de estabilização económica e social há que ter a capacidade para repensar as políticas de proteção social tendo em conta as fragilidades do sistema. É preciso inovar para responder a estas pessoas. É necessário um plano económico inclusivo.
Mas só é possível desenvolver as respostas adequadas com uma Segurança Social pública, robusta e eficaz. Não é possível fazer face a esta crise brutal que nos assolou sem um Estado Social forte que proteja todas as pessoas, incluindo as que vivem no Bairro da Jamaica ou noutra zona carenciada do nosso território, para que ninguém fique para trás.
ATUALIDADE
Catarina Marcelino
Deputada do PS
Ex-Secretária de Estado para a Cidadania e para a Igualdade