Abordar a temática do associativismo, mas no prisma da solidariedade e do voluntariado é algo que parece à luz do nosso quotidiano uma tarefa fácil porque serão conceitos que todos sabemos e praticamos, no entanto é nossa intenção analisar tais considerações com intuito de provocar reflexão não padronizada nas premissas pré-concebidas.
Solidariedade entrou no nosso vocabulário derivando do conceito político e social que era denominado por previdência, implementado especialmente na Europa após a II Guerra Mundial.
Encontramos solidariedade em grupos que atuem para o bem e mesmo nos grupos marginais da sociedade, através de códigos de conduta e outras ligações, no sentido etimológico. Mas, o ser humano valoriza enormemente a solidariedade em momentos de calamidade, porque por vezes, coloca-se a par do valor da sobrevivência da vida, onde se gera mais partilha. Encontramos regiões do mundo onde a solidariedade e a partilha são valores nobres, porque o desenvolvimento económico é quase nulo.
São reflexões provocatórias desta natureza que pretendíamos suscitar e saber até quanto estamos disponíveis para com o outro, a partilha serão pilares que valorizamos? Nem sempre assim acontece! É muito comum na sociedade em que estamos dizer-se que promovemos atos de solidariedade e vangloriarmos de tais feitos, para que os outros reconheçam as nossas ações. Esquecemo-nos que a melhor solidariedade é aquela que oferece a mão direita e a esquerda não sabe o que foi feito. Deveríamos, em algumas situações, estarmos atentos que quem recebe apoios também nem sempre está disponível para expor-se por motivos vários e consequentemente a dignidade humana deve ser respeitada.
A solidariedade individual tende a confundir-se com caridade, esta acaba por viciar quem dela usufrui, ao invés da verdadeira solidariedade que também procura criar soluções de futuro.
Se há décadas atrás a sociedade permitia que alguns cidadãos dispensassem tempo mais do que suficiente para as questões da solidariedade e com grande altruísmo, hoje torna-se mais exigente e rigoroso, porque as balizas legais são enormes e em muitos casos envolvem técnicos para aferir toda e qualquer anomalia.
Ou seja, o grau de voluntariado envolvendo pessoas foi-se alterando. E não confundir voluntariedade com gratuidade, porque todo e qualquer projeto ou missão institucional tem custos de suporte, a manutenção de uma equipa de voluntários exige captação de receitas para o funcionamento daquela equipa. Por absurdo, enviar uma equipa de voluntários para combater uma calamidade, aqueles não podem estar preocupados com as aspetos logísticos enquanto estão em operação, há que ter alguém em back-office a assegurar a logística tida por necessária; se assim não fosse estaríamos muito provavelmente a “atirar” voluntários para se juntarem aos que procuram a sobrevivência entre as vítimas da tal calamidade.
Não há voluntariado gratuito! Voltamos ao que defendemos, tudo deve ter um enquadramento institucional. Poderíamos afirmar que em Portugal há privilégios concedidos aos voluntários de várias instituições, consideramos uma falácia, porque as leis existentes protegem e permitem aos trabalhadores do Estado ou aposentados usufruir algumas vantagens por possuírem o estatuto de voluntário, mas se este for trabalhador por conta de outrem privado, as “benesses” da Lei tem difícil aplicabilidade porque não existe a devida compensação às empresas privadas.
Chegados aqui, todos devemos retirar ilações do pós-convid, por inúmeras razões. Começando por não ter inveja do sucesso de outros e procurar uma sociedade em que o valor do bem-estar de todos seja mais e melhor. O confinamento, ensinou-nos que esquecemos com facilidade a solidariedade e o voluntariado, valorizando a sobrevivência individual e dos que nos são mais próximos sejam familiares ou amigos, descurando a partilha seja no sentido da responsabilidade ou não.
Os tempos seguintes também nos devem incutir um espírito de fazer obra, em detrimento da burocracia que se consome em recursos humanos e financeiros, que vão desde as reuniões aos planeamentos desajustados às carências reais. Centremos a implementar atividades que tenham respostas para algumas questões como: O que é? Para quê? Quem? Onde? Quando?
Uma equipa solidária e voluntária e feliz é uma convictamente uma equipa que transmite aos outros que recebem os contributos com uma enorme energia para saírem do confinamento em que vivem e muito provavelmente encontram naqueles seres generosos uma luz para saírem do poço negro em que se encontram. Saibamos cada um de nós olhar para o lado e ver o que outro precisa ao invés de dar aquilo que entendemos que ele necessita, quando em muitos casos só precisa de um abraço.