A inteligência também pode ser estúpida

Em tese, acho mesquinha a ladainha que se gerou à volta do apoio público do primeiro ministro à lista de Luís Filipe Vieira, candidato a mais um mandato à frente do meu Benfica.

Não vem mal ao mundo, já o tinha feito há uns anos atrás, e toda a gente conhece o seu benfiquismo assumido. Na verdade, o facto até podia ser visto como um ato de transparência. Há tanta gente a esconder o clubismo e a operar por detrás dessa cortina dissimulada.

Mas Costa fez mal. Já tinha cometido o mesmo erro na última campanha de Vieira, só que ninguém deu por isso e, desta feita, redobrou o erro.

António Costa está na política desde tenra idade e, podemos dizer, que em tantas crises de tantos governos onde assentou a sua inteligência tática, as suas capacidades de gestão de conflitos e o seu pragmatismo ideológico, saiu incólume. Ganhou quase todas as guerras, às vezes secando adversários, mas isso faz parte do jogo.

Desta vez Costa, primeiro ministro tinha obrigação e o dever institucional de não se colocar a jeito. As suas funções obrigam-no, na disputa em causa, não a um dever de isenção, mas a um certo dever de reserva. Talvez até por pudor.

Portanto, não havia necessidade de se expor desta forma, colando-se a uma briga clubística que, infelizmente, está eivada de dúvidas sobre o carácter do atual presidente do Benfica, embora a presunção de inocência dite uma regra inabalável da justiça.

Por outro lado, Costa não mediu bem as circunstâncias desse apoio face ao momento que o país está a viver. Os portugueses estão desgastados com a pandemia e os seus efeitos. Por mais que gostem de futebol e dos seus clubes, olham para as lógicas do pontapé na bola com algum desdém. Se a comunicação social levanta o problema – que como insinuei a abrir o texto vale ‘bola’, para usar um dizer de Jorge Jesus – o povo segue a crítica, aponta ao primeiro ministro, a oposição cavalga, cai-o-carmo-e-a-trindade. Neste país é assim.

Com essa pressão inusitada, Costa e Vieira optaram pela retirada de todos os apoiantes com cargos públicos. Foi pior a emenda que o soneto, porque ficou a primeira impressão e o coro de críticas manteve-se. É a estupidez ao quadrado.

Não havia necessidade de o primeiro ministro se prestar a este incómodo, lastrando dúvidas, incertezas e maledicência. Provou-se que o futebol é contaminante, irracional, não raramente sorvedouro de inteligência.

Quanto ao meu Benfica, reconheço o excelente trabalho do LFV, e espero que continue a provar a inocência desta lama lançada desde sempre sobre a sua figura e, concomitantemente sobre o clube. Mas a minha irracionalidade clubística quer apenas que o Benfica ganhe e ganhe sempre. Nesta equação posso raiar a estupidez, mas não sou primeiro ministro…

Raul Tavares
Diretor