O fenómeno do Chega e de André Ventura é coisa passageira ou um rastilho para, pela primeira vez no nosso país, insanar o nosso sistema político e institucional? Não sei responder a esta incógnita de peito aberto e as opiniões que vão surgindo dividem-se.
Sou tentado a olhar para este ‘caso’ como um epifenómeno atendendo às boas lições que os portugueses têm dado sempre que chamados a exercer a sua função capital de escolher o(s) melhore(s) em cada circunstância e momento político.
Mas a verdade é que nos confrontamos, sem nenhuma dúvida, com um projeto populista perigoso, que a democracia permite e aconchega, e sobre o qual é imperioso acautelar toda a vigilância, porque não vale tudo e porque sabemos como começam e acabam estas incursões oportunistas do voto de protesto.
Por isso mesmo, a democracia, a nossa, que tanto demorou a conquistar e a consolidar, não pode deixar abrir brechas ao monstro da intolerância, da indecência e do populismo subversivo, que deve ser combatido fora da lama, com ideias, com projetos e com políticas que retirem espaço ao agigantar de Venturas e afins, peões de uma máquina forjada neste mundo adoentado, onde tudo vale para deitar abaixo as suas fundações.
Tomando por certo algum sossego sobre o futuro inquilino de Belém, é imperioso retirar gás a um balão que enche a cada dia que passa, cavalgando sobre tudo e sobre todos, numa torpe política que ofende os preceitos sagrados da vida em sociedade e a paz que faz de Portugal um país – ainda que com defeitos e muito por fazer – tolerante que olha todos os seus, sobretudo os mais desfavorecidos e marginalizados.
Com a pandemia a retirar fôlego ao voto, sem uma campanha devidamente esclarecida e com a esquerda e a direita democrática muito dividida, paira no ar algo que não cheira bem. Sobretudo porque o voto de protesto é sempre mais presente e, nos sulcos do Chega, há muitos portugueses decentes atrás da onda. Daí esta eleição não ser um ato menor. Votar em massa na democracia é crucial.
Raul Tavares
Diretor