Natércia Maia (Almada) – “Nem me lembro de ter sido colocado o ventilador”

A necessidade de trazer alimento para casa foi mais forte que o medo de apanhar o vírus. Natércia Maia, de 62 anos, de Almada, acautelava as medidas sanitárias e o ‘milagre português’ aligeirava receios. Estávamos em abril de 2020.

“Ainda hoje não sei como aconteceu. Acho que não apanhei no trabalho (faz limpezas numa empresa da capital) porque já trabalhávamos por turnos com menos gente e os transportes públicos nem estavam tão carregados como antes”, afirma ao Semmais.

Mas, a verdade é que começou com muito cansaço e perda de paladar. “Chegou a um ponto em que nada me sabia a nada, e acho que também cheguei a ter falta de cheiro”.

Juntando sintomas, e por ter em casa familiares também com queixas, recorreu ao hospital e veredito foi fatal.  “Era Covid, fiquei para morrer, não sabia o que fazer à vida, porque mandaram-me ficar em casa”.

Um filho e uma das duas noras de Natércia também deram positivo, sendo que a nora doente, foi internada porque, explica, “começou a ter dificuldades em respirar e o cansaço tinha aumentado, a juntar à febre”. E mesmo antes da alta da sua familiar, que demorou “três a quatro dias no Garcia de Orta”, foi a sua vez.

“Estava confinada, recebia telefonemas diários da Saúde 24, mas o meu estado agravou, e a falta de ar foi tremenda, uma coisa sem explicação. Numa das noites que mal conseguia dormir fiquei mesmo assustada e fui direta ao hospital. Fiquei logo internada e no dia seguinte já estava nos cuidados intensivos”, relembra.

Natércia correu perigo de vida e, esteve onze dias em coma induzido, auxiliada por respiração assistida através de um ventilador. “Sinceramente nem lembro de me ter sido colocado o ventilador, devo ter desmaiado ou coisa parecida”.

Quando deu conta de si, sentia “o corpo gasto, muito inchaço e ainda dores em todo o lado, e a respiração ainda não estava muito normal”. Parecia que me tinham batido e, pior que isso, afiança, “foi estar ali sem ter notícias de casa”.

Foi lenta a recuperação, diz Natércia Maia passados dez meses. “Foi muito difícil, porque levei muito tempo a recuperar forças, o que me deixou de baixa um período de mais de quatro meses, mas depois fui vencendo esse problema”.

“Este coronavírus não é para brincar”, afirma. E, acrescenta: “sei do trabalho que todos os médicos, enfermeiros e auxiliares têm tido. Fui testemunha disso, e até continuo com medo de me poder voltar a acontecer, como se tem ouvido de outros casos”.