Lazareto de Porto Brandão em vias de ser hotel e complexo habitacional

A Reformosa, propriedade de uma empresária chinesa, quer transformar o edifício arruinado e centenário num hotel e complexo habitacional. Junta de Freguesia apoio tudo o que “possibilite o crescimento económico”.

Em Porto de Brandão Almada, está um dos mais icónicos e negligenciados edifícios do concelho. O Lazareto ou Asilo 28 de Maio continua a atrair a atenção de visitantes, mas também de empresários ligados à hotelaria. Debruçado sobre o Tejo, o imóvel com 172 anos, pode em breve transformar-se num hotel e num conjunto habitacional. A atual proprietária, a empresa Reformosa detida por uma chinesa, avançou para o processo de licenciamento em 2020, mas desconhece-se quando é que os trabalhos podem começar.

Contactada pelo Semmais, a câmara de Almada limitou-se a dizer que o terreno é propriedade privada e que, por esse facto, a sua intervenção em futuros projetos é nula. A presidente da Junta de Freguesia da Trafaria, Sandra Chaíça disse, por sua vez, reportando-se a projetos existentes para aquele local ou outros na localidade, que “o licenciamento urbanístico é uma competência que não se encontra na esfera das juntas, pelo que estes dados não poderão ser, a nós, equacionados”.

Sandra Chaíça, mesmo sem se pronunciar sobre eventuais empreendimentos para Porto Brandão, referiu, no entanto, que “a apresentação e concretização de projetos que valorizem o património arquitetónico local, bem como possibilitem o crescimento económico do território, associado ao aumento da capacidade de emprego, serão sempre bem vistos aos olhos de quem governa com a preocupação de melhorar as condições de vida das populações”.

Empreendimento guardião de muitas histórias

Antes de se tornar propriedade da empresária chinesa Ming Hsu, o edifício pertenceu à Sonangol, de Isabel dos Santos. No entanto, a sua história iniciou-se em 1861, quando começou a ser edificado para se transformar no Lazareto de Lisboa. Era ali que, por precaução clínica, devido a surtos de doenças mortais, como a febre amarela, ficariam de quarentena todos os viajantes que chegavam de barco a Lisboa. Nos seis anos que demorou a ser construído, o Lazareto, que foi considerado o maior do mundo, custou 535 contos de réis. Sendo por muitos apontada como uma estrutura cara para quem nela se acolhia, o edifício chegou a ter, em 1901, 33 funcionários em permanência.

A história e os avanços da medicina encarregaram-se, no entanto, de alterar o rumo. Em 1918, no final da I Guerra Mundial, o Estado português resolve transformá-lo num “Depósito de Convalescentes e Extenuados da Guerra”, repatriados de França e de África. Um ano depois já era também utilizado como presídio militar, acolhendo, por exemplo, Paiva Couceiro, que foi comandante dos revoltosos da chamada Monarquia do Norte.

Ao sabor das mudanças políticas e sociais, o Lazareto funcionou, entre 1928 e 1939, como “Azilo de Creanças”, juntando 1.500 menores considerados indigentes e provenientes de outras instituições que existiam em Lisboa. É nessa altura que adquire o nome de 28 de Maio, data do golpe de Estado (em 1926), a que inicialmente se chamou revolução Nacional e iria depois estar na génese do Estado Novo.

Entre 1939 e 2007 pertenceu à Casa Pia de Lisboa, que ali acolheu raparigas órfãs. Em 1963 alberga cerca de 30 famílias provenientes de Porto Brandão e Banática que tinham sido desalojadas devido a temporais.

Depois, logo após a Revolução de 1974, as instalações foram ocupadas por cerca de 150 famílias constituídas por mais de 600 pessoas provenientes das antigas colónias, sobretudo de Cabo Verde. É ali que vivem até 1995, altura em que o então primeiro ministro, António Guterres (e também a derrocada de um telhado que acaba por matar duas crianças) determinam que o local fosse abandonado. Antes disso, em 1991, já se falava da instalação de um hotel de cinco estrelas, projeto que nunca avançou, mas que, ao que tudo indica, poderá agora ser concretizado através da Reformosa.