“Esse silêncio que determina o almoço” na Casa Da Música Jorge Peixinho

Foto: Luana Santos

Espetáculo apresenta um registo autobiográfico, onde saltam para o palco episódios que marcaram profundamente a infância e a adolescência do encenador.

“Esse silêncio que determina o almoço”, produzida pela Companhia Mascarenhas-Martins, estreia esta sexta-feira pelas 21h30 na Casa da Música Jorge Peixinho, onde permanece em cena até 3 de novembro, com sessões às sextas-feiras, sábados e domingos. Escrita e encenada por Miguel Branco, a peça apresenta um registo autobiográfico e aborda temas que marcaram profundamente a vida do criativo.

“Comecei a escrever este texto em 2021, depois do Natal. Foi um bocado na ressaca do que é a consoada e dos encontros à mesa. Acabou por ser um percurso natural sobre aquilo que queria escrever. Já tinha feito o “Até parece” e “Há dois anos que não como pargo”, peças encenadas pelo Leví Martins, que também tinham um registo autobiográfico, mas recorriam muito à ideia das metáforas, das personagens e dos sítios. Nasceu dessa vontade de ter de deixar cair essa ideia e de falar das coisas, tratá-las como elas são”, refere o dramaturgo em conversa com o nosso jornal.

Escrita ao abrigo do programa de Bolsas de Criação Literária da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas 2022 e amadurecida no decorrer de várias residências artísticas, a obra aborda a relação de Miguel Branco com a família, em especial com o irmão e a mãe. “O crescimento do meu irmão, a sua adolescência, a sua relação, a certa altura muito conflituosa, com a minha mãe, era algo que me marcava e marca muito. Houve esse impulso natural de expressar algumas inquietações internas. Precisava de falar sobre isto. Não deixa de ser um pouco terapêutico, mas é sobretudo uma tentativa ingénua de pensar que isto pode alterar as relações entre os seres humanos, que a minha família, ao ler este texto, pode repensar a forma como nos relacionamos”, explica.

Peça é protagonizada pelo ator João Jacinto

Segundo o encenador, neste relacionamento familiar salta à vista a ideia de dinâmicas de um triângulo e quadrado. “Foi algo que concebemos na construção do espetáculo e pensamos que seria interessante explorar. Havia um triângulo entre o meu pai, mãe e irmão, antes de eu nascer. Depois, comigo, transformou-se num quadrado, mas rapidamente se desvaneceu e voltou ao triângulo, porque o meu irmão se foi afastando, deixando de se identificar com os ideais dos meus pais, mais à esquerda”, sublinha Miguel Branco.

Um dos desafios que o dramaturgo teve de ultrapassar foi a construção cénica do monólogo textual que estava a construir e que será interpretado por João Jacinto, a que se juntam as vozes de André Alves, Luís Madureira e Maria Mascarenhas. “As primeiras páginas vêm de um vislumbre de cena. Era a ideia de uma figura masculina sentada a comer um iogurte e a falar sobre iogurtes, como um mergulho na infância, de regresso à escola. Esse era um início mentiroso, o desafio era dar a volta e introduzir a minha família. Portanto, nunca pensei numa grande produção cénica. Vamos ter um ator em cena, com poucos elementos cénicos, alguns jogos de luzes e, sobretudo, uma relação muito próxima com o público”, explica o encenador.