Vai passar.

Vai passar. Claro que sim. O que nos incomoda é que não sabemos quando. Início de maio? Final de maio? Junho? Quando? Mas vai passar, sem dúvida nem senão.

Olhando o mundo pelo “lado do turismo” não vos vou repetir todos os números que todos os dias nos são lembrados. Na verdade apenas um número interessa: zero.

Zero faturação em final de março. Zero faturação em abril. E, provavelmente, próximo de zero faturação em maio.

Não vos vou lembrar, também, todas as análises que todos os dias são feitas sobre o turismo. O diagnóstico está feito e repetido. O que vos vou lembrar é, outra coisa diferente, o facto de que quando estamos no zero só podemos crescer, só podemos melhorar. E este deve ser o nosso ponto de partida.

Todas as crises trazem mudança. E esta é uma crise única. Única pela origem: um raio de um vírus. E única pela dimensão: absolutamente global e absolutamente devastadora.

Para uma Região como a nossa (Região de Lisboa) que depende em 80% do transporte aéreo, o futuro será, em larga medida, decidido pela rapidez com que o setor do transporte aéreo vai incorporar as alterações necessárias para garantir a segurança e a saúde de todos.

Claro que já vivemos isto. O choque da segurança foi totalmente incorporado pela aviação, pelas estruturas aeroportuárias e, mais importante, pelos viajantes. Hoje é normal chegarmos aos aeroportos com maior antecedência. É normal todas as bagagens passarem por um scanner. É normal, às vezes, sermos revistados. É normal ainda tirarmos as botas e “ficarmos descalços” por um momento Tudo em nome da segurança.

Agora será em nome da saúde. Da nossa. Da dos outros. E a rapidez com que o transporte aéreo recupere e tome as medidas necessárias será a medida do tempo da recuperação do turismo.

Não tenhamos dúvidas que o desejo de viajar veio para ficar. Faz parte do quotidiano do cidadão comum do século XXI. O turismo é hoje democrático e não mais elitista. Muitos e muitas viajam e continuarão a viajar assim que for possível. Este impulso, esta atitude, esta normalidade das nossas vidas vai voltar tão rapidamente quando possível. E esta é a garantia maior do futuro do turismo.

Claro que temos de saber como vão ficar as companhias de aviação. Como vão ficar as empresas. Como vão ficar as instituições. Como vão ficar os governos. Como vamos ficar todos.

Certamente mais endividados. E para quem como Portugal, tem uma dívida muito elevada, este regresso progressivo à “normalidade” tem de vir acompanhado de um conjunto impar de estímulos. Chamem-lhe plano. Chamem-lhe o que quiserem. Mas convém manter a serenidade, o sangue frio e a inteligência de garantir duas visões. Que estes estímulos sejam globais. Tradução para globais: europeus. Que estes estímulos não se limitem a empurrar dívida com a barriga. Porque um dia a barriga não será suficiente para lidar com tamanho peso.

Voltarei ao tema. Numa próxima opinião só falarei de soluções. As óbvias. E as menos óbvias. O risco do “mais do mesmo”, quando o “mais do mesmo” desapareceu. E a ousadia do diferente. Em particular do diferente que pode ser medido (cada euro será então demasiado precioso para ser desperdiçado). E do diferente que já tentado deu bons resultados.

Permitam-me ainda destacar o título desta breve opinião. O título é roubado ao título de um samba de Chico Buarque (1986) e como tudo o que ele compõe e escreve é, no mínimo, inspirador. Diz ele: “Palmas para a ala dos barões famintos/ O bloco dos napoleões retintos/ E os pigmeus do bulevar/ Meu Deus, vem olhar/ Vem ver de perto uma cidade a cantar/ A evolução da liberdade/ Até o dia clarear”.

Venha então essa liberdade.

TURISMO SEMMAIS
Jorge Humberto
Colaborador