Ensaio sobre a teimosia

Confesso que andei às voltas com o tema desta semana numa tentativa de escapar à “Festa do Avante!”, mas a campanha de vitimização e os louvores a um evento que, só terá corrido bem porque foi um fiasco, levaram-me a partilhar algumas reflexões.

Ao longo dos anos, o Avante! atraiu multidões à Atalaia (Amora), nesses anos foram feitas muitas perguntas sobre as contas, sobre a segurança, sobre os apoios, todas ficaram sem resposta. Este ano, no meio de uma pandemia as questões de saúde pública impunham que qualquer entidade que quisesse organizar um grande evento seria sujeita a um saudável escrutínio público. O PCP, mesmo invocando as normas constitucionais, não poderia eximir-se a este escrutínio não por o “comunismo ser contagioso”, mas porque qualquer ajuntamento representa um perigo potencial para a saúde pública. E mais uma vez o partido se refugiou na opacidade e em acusações disparatadas. Entendamo-nos, não se tratava de uma questão política. Tratava-se de uma questão de SAÚDE.

A gestão deste dossier mostrou que o PCP ainda não percebeu o quão insensato era a realização da sua rentrée nos moldes habituais. E isso viu-se na atitude pouco transparente e pouco cooperante que teve para com as autoridades de saúde. Ficou sempre subjacente uma atitude de desafio às normas, uma espécie de “por detrás do Marão mandam os que lá estão” que não é aceitável num partido que goste-se ou não, faz parte do arco de governação deste país estando obrigado a dar bons exemplos. Não foi o que aconteceu.

No rescaldo, não posso deixar de me interrogar quais foram os recursos que a DGS alocou para esta festa numa altura em que existiam diversos surtos em lares de idosos, em se prepara o regresso às aulas e o regresso ao trabalho presencial Estas deveriam ser as prioridades, mas em lugar disso, numa altura em que os números estavam a subir, a DGS viu-se obrigada a medir forças, a perder um tempo precioso e a desgastar-se. O PCP pôs os seus interesses acima das pessoas.

Felizmente, muitos potenciais festivaleiros e militantes entenderam que havia perigo e, mesmo tendo alegadamente comprado bilhete, ficaram em casa salvaguardando-se a si próprios e à comunidade. As imagens de um recinto quase vazio mostram que, no final, o bom senso prevaleceu. Não se tratou de uma esmerada organização, tratou-se de uma deserção em massa. Evidentemente que o facto de não terem sido nem 100.000, nem 33.000, mas menos de 16.000 reduziu o risco de potenciais focos de contágio.  Ainda será cedo para fazer essas contas, mas ninguém deixará de estar atento aos números nas próximas semanas.

A estratégia de vitimização escolhida pelos responsáveis é a todos os títulos lamentável sobretudo quando se trata da população da cidade de Amora. Havia um alarme social significativo, perante uma organização que desde a primeira hora quis fazer transparecer que era “business as usual” inteiramente compreensível e legítimo que moradores e comerciantes tivessem manifestado o seu desconforto perante a ignorância dos procedimentos que só foram conhecidos à última hora e tirados a ferros. O que não é normal nem legítimo foi o bullying a que foram sujeitos comerciantes e moradores e que estão à vista de todos nas redes sociais.

O partido com paredes de vidro mostrou mais uma vez, que não gosta de ser escrutinado!

CRÓNICAS DISTO E DAQUILO
Catarina Tavares
Dirigente Sindical