Um lugar maternal

O título do poema escolhido é feito de quatro palavras, todas elas muito ligadas e características desta nossa região, que a fazem muito procurada quando se quer destino para o bem-estar e a paz interior, tanto mais nos tempos que correm.

É um lugar que existe e permanece na sua vastidão, onde o silêncio se escuta, principalmente, aquele que nos vem de dentro e se harmoniza com a natureza.

Tem sempre para nos dar aquele acolhimento que nos sabe bem, seja pelo sorriso sábio de quem não se importa e até propicia a anedota sobre si mesmo, seja no carinho que dispensa ao visitante, envolvendo-o num abraço maternal. Sim, aquele gesto que abre a casa e é confidente, que não recrimina e que descontrai, aliviando as maleitas do dia a dia.

O Alentejo continua a ser a região do país mais procurada, dizem-nos as estatísticas e as notícias. Decerto algo de especial lhe encontrarão os visitantes, coisa que irá muito além de uma justificação económica que enforme a oferta turística e que, a meu ver, em muito encontrará explicação nas premissas deste poema.

Eu, também, sendo deste Alentejo em que me conheço e me conhecem, me encontrei no lugar e em silêncio, como quase nenhum outro existe. Um silêncio que é feito a partir da raiz e que bebe da seiva do sítio a que se pertence e que é redescoberto, sabendo bem voltar da jornada que a vida nos impõe a um corpo andarilho.

É claro, que essa redescoberta de que falo, não é tanto física mas espiritual e motivada pelo influxo do tema poético, que já esteve tão presente e agora me levou a outra escrita, mais impulsionada pelo mar e menos pela planície. Sendo o mar, também, do litoral Alentejo e com motivos de inspiração, é certo que o silêncio do campo é aquele que parece melhor predispor a um sentimento de abandono, dando ao corpo o gosto lânguido de se perder entre os lençóis.

E, por fim alguns dirão: coisas de poeta?! Valha-nos o Alentejo. SemMais!

 

Só o lugar permanece num abraço maternal

 

Esta sensação de sermos vela que se apaga

no escuro da noite profunda e serena,

assim como o eco do cão que ladra

se vai esvaindo puxado pelo silêncio que o esvazia e cala.

Deixamos ao corpo o lânguido sabor de esmorecer entre lençóis

e os olhos dobrarem-se por pensamentos distantes.

 

Só o lugar permanece num abraço maternal

de quem conhece e espera

o olhar vadio sempre pronto para mais uma viagem.

 

Há lugares construídos de nós mesmos,

adivinhação de nossos pensamentos,

tão prontos no tempo paciente,

oferecem a palavra que nos falta.

 

Uma linguagem de silêncios,

suficiente no gesto e no olhar,

aquela feita da palavra desnecessária,

a que existe antecipada, a que tudo lhe sobra

na esperança do que lhe fica, no resto e do lugar.

                                   (Inédito)

José António Contradanças
Economista / Gestor