Discutem-se as razões pelas quais o candidato da extrema-direita tanto apostou no Alentejo, com os resultados que se conhecem, obtendo uma fasquia importante dos votantes de Évora, Beja e Portalegre.
É verdade que o discurso de protesto e anti-sistema de André Ventura parece ter assentado que nem uma luva em muitas das terras alentejanas, a braços com alguns estigmas, mas o fenómeno percorreu muitas regiões do país.
O que foi então mais óbvio no caso alentejano? Três questões centrais a meu ver: a questão insana da ‘guerra’ contra os ciganos (veja-se que Ventura alcança o segundo lugar em concelhos onde esta comunidade pontifica, casos de Moura, Monforte, Estremoz, Elvas e outros); o grande número de imigrantes que a região acolheu para trabalhos nos campos; e a depauperação de muitos serviços públicos, o que implica a ausência de Estado por estes lados.
Mas há outros fatores eleitorais a ter em conta, como seja o facto de Ventura ter conseguido gerar uma onda de novos votantes, mais jovens, que terão ido a reboque desta narrativa fácil assente num maniqueísmo perigoso, em que há bons e maus. Uma anarquia argumentativa que importa não alimentar.
Por outro lado, parece ter havido uma boa fasquia de ausência de muitos votantes tradicionais que optaram por ficar em casa. Uma população mais idosa, que preferiu o confinamento às urnas.
Portanto, não é certo que este voto na extrema-direita se fidelize no território eleitoral alentejano, e muito menos que se venha a consolidar em eleições de outro tipo. Mas o contrário também não pode ser chutado para canto.
Em democracia todas as ideias são válidas, mas deve haver o mínimo de perceção do que estamos atualmente a vivenciar, e muita vigilância aos sinais perigosos que perturbam ou podem vir a perturbar a nossa forma de estar e de viver em sociedade, sem ódios e sem radicalismos bacocos.
O facto é que o discurso argumentativo de André Ventura e do Chega não aponta nem ideias nem soluções para nenhum dos problemas, nem da região, muito menos do país. É uma guerrilha verbal de divisão dos portugueses e de ataque às minorias e aos mais desprotegidos, que gera mais desigualdades. Um verdadeiro pântano que, a não ser contido, faz perigar a democracia que tanto tempo levou a construir e a consolidar.
Mas o combate a este projeto de radicalização à direita não se deve combater na lama, mas sim com projetos políticos que entendam o descontentamento dos eleitores e que promovam soluções. Coesão, mais serviços públicos, melhor articulação institucional, investimento na criação de emprego, mais justiça social e mais segurança, menos desigualdades e mais aposta na formação.
Raul Tavares
Diretor